CRISTAL

CRISTAL

Sobre amigos já falei eu mesmo
E asseguro que não foi a esmo,
Às vezes basta que se olhe,
Mas não é algo que simplesmente se escolhe,
Na verdade, porém, só se descobre
Nada importando se rico ou pobre
E nem que chegue mais cedo ou mais tarde…
É um afeto que no peito arde
Sem nenhuma dor e sem alarde.
É a alma de um outro ente,
Que penetra na alma da gente
E lá se instala sem ocupar espaço
Como se fosse um permanente abraço…
Olhar que se olha no olhar
No qual se sente o brilhar
Da mais pura e fiel lealdade
Onde não cabe a sombra da vaidade
Mas a luz forte da própria amizade
Transparente órfã de qualquer mal
E tão translúcida como o puro cristal.

Joffre Sandin
(8 de outubro de 2012)

COVARDE GROSSERIA

País bonito, cidades atraentes,
Essá é a Rússia em todas as vertentes.
Mais mulheres do que homens
Eslavos, na maioria das gentes.

Contudo, há algo que incomoda,
Talvez herança dos anos vermelhos,
Onde todos só miravam tristes espelhos,
As covardias remanescem na moda.

E em todo relacionamento de casal
A mulher é tratada como inferior
Ainda que ali resida arremedo de amor,
Apanhar do parceiro é coisa normal.

Por que assim acontece, qual a razão?
Costume machista está entranhado
Nesse estúpido tipo de atuação,
E a mulher submissa tudo tem aguentado.

As jovens acostumadas aos ancestrais
Vêm as surras como atos naturais,
A mãe, a avó, a bisavó, todas apanhavam
E, por causa do hábito, tudo aceitavam.

Mas, já é hora, vi nos olhos das meninas,
Que já pensam em seu mundo reformar,
Inconformadas com suas próprias sinas,
Por dignidade, muitas delas, vão lutar!

Joffre Sandin
São Petersburgo, 05/09/2019
(Poema feito em homenagem à minha guia em São Petersburgo, a jovem Nina, que me revelou tal absurdo)

CONFISSÃO

Sou um privilegiado!

 

Às vezes, me indago…

Quantas vidas tive que viver

Até voltar a ser o atual ser

E receber do Criador o afago

Dos privilégios que me concedeu?

 

Por quê eu?

 

Quando caminho e ouço sonoros cantos

Que se espalham por todos os cantos,

Dentre as árvores que me abrigam,

Mesclados às músicas eruditas

Vindas da modernidade do celular,

 

E como são benditas…

 

Suavizando o meu andar

Só porquê a tudo posso escutar…

E percebo que posso sentir

Os perfumes da Natureza,

Que me envolve com sua beleza,

 

O que me leva a sorrir…

 

Já sei o que é existir,

Onde parar e aonde ir,

Passos, com minhas pernas, posso dar,

Posso correr ou deambular

E meu viver aprimorar.

 

Escuto, então, a minha voz

 

Distraída a cantarolar

Os sons que recebo do celular,

Enquanto estou a me exercitar.

Prática que herdei da infância

E, ainda hoje, é ressonância

 

Do que necessito para viver e devo cumprir para merecer

 

A longa vida que já tenho

E já me enrugou o cenho

Sem me tirar a energia

Nem, tampouco, a inspiração,

Que brota do coração

 

E escorre até a minha mão

 

E se transmuda em poesia,

Que, não sei se boa ou não,

Me ajuda a narrar o que vejo,

O que ouço e o que sinto.

E aqui não posso mentir e não minto:

 

É privilégio e missão!

 

Da qual não devo e não quero

Abdicar ou, ainda menos, desistir

Pois à vida preciso descrever –

Não sei se sou eu, em mim, ou outro ser –

Mas instrumento sei que sou

 

E nunca fico onde vou…

 

Atributos me foram doados,

Com abundância, reconheço,

Acho que por ser um recomeço,

Acompanhados de muitos fardos,

Amealhados em passados…

 

Nunca fui abandonado,

 

Males do corpo superados

Pela força compensadora

Da persistência tresloucada,

Inconsequente e criadora

De tantas vidas redentora.

 

Por conhecer o sim sem ignorar o não.

 

A percepção do Sopro sussurrado,

Muito perto do Portal de acesso,

Bem pertinho do meu começo:

– “Mais uma vez, viva! –

“Lute, faça viver e sobreviva”

 

 

 

Remanesce em minha mente…

 

E me ajuda a cumprir a sina

De lutar, perdendo ou ganhando,

Superando tal desígnio com calma,

A viver, de novo, com minha gêmea alma.

Sou um privilegiado…

 

Confesso!

 

Joffre Sandin

30 de novembro de 2020.

 

 

 

CARTAGENA DE INDIAS

Incrustada entre islas de la misma cuna

Teniendo el sol a iluminar su gente

De tez morena y corazón caliente

Que jamás huyó de batalla alguna

 

Puerta cobiada por piratas y invasores

Sus calles teñidas de sangre y sudor

Que a ellas llenavan de lucha y amor.

India violada sin pena, piedad o pudor.

 

Todos los colores le vistieron el alma,

El tiempo a pasar sin tomar su calma

Incluso causando dolor y sufrimiento

Y, aún asi, no logró su afeamiento.

 

Sin embargo, mujer fuerte a ocultar su llanto

Nació pequeña, hermosa y valiente en bahia lejana

Se cercó de faldas a proteger su encanto

Sin esconder el calor que de ella se emana

 

Así, sus murallas abrazan lo que es bueno

Y su gente se vive como si fuera en sueño

Esparciendo de dentro de su propio regazo,

Amor, simpatía y cariño, pedazo a pedazo.

 

 

Joffre Sandin

Cartagena de Indias

23/11/2017

BOLERO

BOLERO

A melodia do amor e da dor
Que nasce do amar com amor
Que não se importa de dar,
Sem contrapartida buscar

Ainda que o coração malvado
Sem dó, já não esteja ao seu lado,
Na súplica do momento fortuito
Insano implorar:- beija-me, beija-me muito…

Mesmo que somente uma vez
Angústia que traz a desídia
Daqueles olhos verdes a mirar

Quiçá, quiçá para então revelar,
Tendo na mão a Cuba-Libre da perfídia,
Que, se preciso fosse, começaria tudo outra vez…

Joffre Sandin
Princeton, 9 de junho de 2019
(Logo após ouvir uma linda interpretação de “Historia de Um Amor”, pela banda ^French Latino”, animei-me a fazer este soneto, no qual, possivelmente, só os meus amigos de sessenta anos para cima, irão identificar alguns versos vertidos para o Português, que ousei extrair de alguns boleros antigos, além dos que, para finalizar, tomei por empréstimo do saudoso e fantástico poeta, Gonzaguinha.)

AOS MEUS IRMÃOS

Não sei como começar,

Nem, tão pouco, como falar,

Mas Deus nos deu de presente

Seu verde olhar incandescente,

Sua alegria contagiante

E seu sorriso radiante…

 

Deu-nos, também, o amor

E o carinho do seu calor,

Desde que chegamos à vida,

Carícia sempre incontida

Num coração tão imenso,

Abrigo suave, mas intenso.

 

Fomos privilegiados, é certo

Enquanto a tivemos por perto,

Mas não nos desesperemos,

Pois sabemos que a teremos

Cada vez que dela lembrarmos

E saudosos por ela orarmos.

 

Ela não nos deixou tristeza,

Somente alegria e a nobreza

De sua alma tão bela,

Que, de uma cor, fazia aquarela

Deixando pintado na tela da vida

Um grande arco-íris, nossa guarida.

 

A existência é repleta de nãos

Ela foi o sim que sempre tivemos

O apoio que sempre recebemos…

É hora de nos darmos as mãos,

E, ao lembrarmos que dela viemos,

Termos certeza de que somos irmãos.

 

A sua benção para todos, MAMÃE QUERIDA.

 

Joffre Sandin

Princeton, 15 de janeiro de 2020.

(Dia da passagem para a nova vida da CIDOCA, minha mãe)

SEVENTY FOUR

Now I’m turning seventy-four

However, my mind feels as twenty-four.

Unlike the body still bold,

I can’t deny it’s getting old.

 

Wisdom and knowledge

Even growing up time by time

Aren’t able to show the sign

On the running to the edge.

 

Anyway, I shouldn’t complain.

I always could choose the plain

No matter facing many hills

 

For building my life and my name

Leaving to my family the frame

To be always good but never bad news!

 

Joffre Sandin

Barraco no Morro, 05 de maio de 2020

 

ACEITAÇÃO

Prevalece na vida o não!

Ouvir respostas negativas
Não é destino de poucos
Nem é meio de gerar loucos,
Entre pessoas mornas ou ativas.

Nem sempre se tem razão!

Percalços, dissabores são parte
Da rica ou da pobre existência.
Na verdade, são mesmo essência
Do crescer na vida com arte.

Mas, como proteger o coração?

Já soube o Criador protegê-lo,
A ninguém concedeu um só norte,
Talentos acompanham a sorte,
Mas de todos cuida com igual zelo.

Ora, onde estamos nessa multidão?

Somos parte de sistêmica constelação
E prosseguimos desatando os nós
Dos que vieram bem antes de nós
E o nosso único meio… é a aceitação!

Joffre Sandin
24/05/2019

ABSTRAÇÃO

Ao longo de toda a existência
Há muita briga e pouca paciência
Desaforos, impropérios, xingamentos
Esquecidos em seguida aos momentos.

No entanto, algumas vezes, o rancor
Emerge claro em meio à discussão
E denuncia toda a falta de amor
Que estava guardada no coração…

E passa a ser ofensa, desrespeito
Que busca ferir o outro bem no peito
Revelando, às vezes, só ingratidão

O ofensor chega à falta de respeito
Deixando ao outro ofendido só um jeito:
Dedicar-lhe a mais real abstração!

Joffre Sandin
07/08/2019

A VERDADE (QUE MAL HÁ NISSO?)

Sabe de uma coisa?

 

Hoje, eu vi, declamando na multidão,

Um porta-voz de uma grande liquidação

De tudo que cerca a vida nesta época

Em que mais se reza e mais se peca.

Ao olhar para cima sem ver o céu

A se buscar nas tendas a sobra de mel

Pois só se crê no imprevisto,

E se espera por um elfo chamado Noel

Enquanto se olvida de um distante Cristo.

 

E comecei a pensar: o que há de mal?

A ideia é tentar desviar a atenção

Dos sem talentos, esquecidos pela sorte

Quem sabe trazendo a triste ilusão

De que um gordo mito, criado no Norte

Possa socorrê-los com mágica abissal,

Toldando mentes com bugigangas e brinquedos

Estimulando comércio, sem muitos segredos,

Mascarando a tristeza com simples folguedos.

 

Então, repeti: que mal pode haver, afinal?

Ainda que o Aniversariante, em pleno Natal,

Remanesça esquecido… nas igrejas limitado

A simples presépios, sempre postos ao lado.

Não importa a idade, não importa a razão,

O vermelho da roupa, as botas, o trenó

Esperto e sabido o velhinho dá um nó

E o povo se farta em total abstração

Da farsa que, no mínimo, lhes toca o coração.

 

Afinal, o que há de mal?

 

 

Joffre Sandin

Princeton, 12/fevereiro/2018