“Espero que a minha ousadia ao publicar esta obra encontre o respaldo dos leitores, que ela desperte o interesse pela poesia, pela música, pela pintura, pela arte enfim, mas principalmente pelo resgate de nosso, hoje, tão maltratado idioma”
Dedico à Liliana
“Tu, mais que musa, foste sina
E, acima do amor, és lírico encanto!”
aos filhos e neto
“Gerar filhos é soma de amor,
E o resultado da operação?
Ser avô…
O que é pura paixão!”
e aos meus amigos
“Inda que a vida – que passa num instante – separe caminhos ao longo da estrada, amigo é o amor sem motivo e sem nexo”
Apresentação
Ao me dispor a publicar este livro assombrou-me uma pergunta: como possibilitar aos leitores o entendimento das poesias que escrevo, já que elas guardam profundo liame com o que sinto, penso e vejo, são pedaços da minha personalidade colados às coisas, atos e fatos da natureza e do cotidiano, transformadas em leitura, enquanto o hábito literário não é mais tão comum, nessa era da “Internet” e no ambiente quase desumano forjado pelo egoísmo coletivo, que ora atravessamos?
Optei, então, por criar uma narrativa esclarecedora, que não se trata de uma autobiografia, mesmo porque não há em mim nem a mais remota pretensão de merecer qualquer estudo biográfico, ainda que realizado por mim mesmo. Trata-se, só e tão somente, de uma descrição mais ou menos ordenada de explicações sobre motivações das poesias por mim colhidas em meu acervo para compor esta obra e a razão de sua própria existência.
Na verdade, num mundo cada vez mais materialista e menos romântico, onde os jovens estão preocupados em trabalhar intensamente após terem se preparado em escolas de graduação e pós-graduação, tanto no Brasil quanto no exterior, em busca dos sonhos de sucesso que nós mesmos, como pais, professores ou, de qualquer outro modo, paradigmas, lhes incutimos e, por essa mesma razão, distanciando-se ou abdicando de melhor qualidade de vida, sendo explorados por empresas nacionais e multinacionais (conceito mais e mais difícil de identificar), perdidos que estão em “market share’s”, “brake even’s”, “ebtida’s” e etc, a sensibilidade para o lírico, o poético, o melódico, o emocional, seja no campo da música, das artes plásticas ou, muito mais fortemente, das letras, sempre me pareceu ter quase que desaparecido.
E sinto que a responsabilidade é realmente nossa. Sem nenhuma chance de errar, assumo a certeza de que a maioria absoluta da população brasileira atual, excluída uma parcela não muito considerável da minha própria geração, jamais aprendeu adequadamente a ler poesias, sejam rimadas ou não, limitadas pela métrica ou não.
Raramente ou nunca se lhes ensinou que poesias são expressões artísticas, com ritmo, melodia, compasso, que devem ser declamadas e não simplesmente lidas, pois retratam a captura que o senso do poeta faz do que vê, do que ouve e do que vive só por existir em um planeta chamado Terra, insignificante grão de areia no Universo, mas que, ao lado da tristeza, do desconforto, do desespero, conserva, igual e paralelamente, a alegria, a beleza, a fé.
Ultimamente, todavia, em conversas com muitos amigos, a maioria na minha faixa de idade, mas, para minha muito agradável surpresa, também com alguns jovens, percebi crescente interesse nessa forma tão significativa de arte que é a poesia, aliviando um pouco a nossa culpa pelo que estamos deixando para o futuro.
Para meu entusiasmo, fui instado, várias vezes a declamar algumas (para mim modestas) peças de minha autoria, percebendo o agrado que causava nos circunstantes e como conseguia despertar entre eles o desejo de revelarem seus próprios modos de descrever poeticamente a vida.
Os elogios de minha mulher, musa constante de meus versos, que, por isso mesmo, sempre considerei parciais, conjugados com os de amigos e familiares, aos quais também atribuo uma grande parcialidade, estimularam-me a publicar este livro, mesmo sem saber realmente se tenho méritos para fazê-lo.
No entanto, é a minha contribuição, se não for missão, no sentido de tentar tornar mais amenas e suaves as agruras da nossa própria trajetória diária, quem sabe auxiliando as gerações de nossos filhos e de nossos netos a tornarem mais humana a vida neste santuário terrestre, que insistimos em destruir.
Nesse passo, a minha intenção é ir introduzindo ao longo desta narrativa, sem observação de ordem cronológica, algumas das poesias que produzi, buscando explicar-lhes a razão de ser e porque brotaram de minha mente naquele momento, ainda que persista em mim dúvida constante, a mesma que chegou a assombrar o Príncipe da Dinamarca, na peça “A tragédia de Hamlet”, de William Shakespeare: “ser ou não ser (e, aqui, eu acrescento: poeta), eis a questão”.
Não obstante eu sinta que consigo construir algo de cunho poético, num estilo próprio em que mais me sirvo de métrica livre, não alcanço a certeza de que seja, realmente, poeta. Mas, acabei cedendo aos anseios de minha mulher e dos amigos e, ao me decidir sobre esta publicação, manifestei minha titubeante decisão nessa poesia…
Joffre Sandin
Parte 1 – Infância
“Venha conhecer a vida
Eu digo que ela é gostosa”
(Caetano Veloso)
Embora duvidando de minha capacidade poética, desde o princípio da adolescência, o que pensava era traduzido em versos. E fui vivendo e me envolvendo cada vez mais intensamente com a vida…
COMECEI A ESCREVER
Comecei a escrever…
Não sei se tenho pendores,
Mas tenho história
E pendurados em minha memória,
Muita vida, algumas dores, grandes amores.
Comecei a escrever…
Quero do singelo me lembrar,
Do pobre, do remediado, do rico,
Do reto, do falso, do mico,
Do sujo e também do limpo,
De viver quero falar.
Comecei a escrever…
Não sei se sei,
Mas quero tentar!
E essa dúvida emergiu forte quando, há alguns anos, estava eu convalescente na UTI do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, logo após uma intervenção intracardíaca na qual um “stent” fora introduzido em meu coração por meio de angioplastia, desobstruindo uma coronária com bloqueio de oitenta por cento do fluxo intra-luminal sanguíneo. O “ stent” recuperou-me a saúde fazendo-me refletir com muito mais profundidade sobre a nossa existência e a sua própria efemeridade. Ali eu percebi que, na verdade, a arte é a própria vida e tudo que nos cerca nesta passagem terrestre.
Ela está à frente e, ao mesmo tempo, no interior do pintor, do escultor, do músico e, também, do poeta, os quais só fazem captá-la e materializá-la com seus dons, para que seus próximos possam compartilhá-la.
Naquela sala, onde outros sofriam, certamente, mais do que eu, assomou-me, repentinamente, o desejo de escrever sobre o que acabo de narrar, motivo pelo qual solicitei aos enfermeiros que me fornecessem papel e caneta para que pudesse fazê-lo, nascendo assim a formalização da minha incerteza sobre ser ou não poeta. Denominei-a, consequentemente…
NÃO SEI SE SOU
Olho ao meu redor, reflito, mas não sei se sou…
No céu, na terra e até no chão,
Donde brota a água que o morro desce,
Cortando valas, rasgando o vão,
Rompendo fendas, caudal que cresce
Sem resistência sempre a buscar
As águas verdes do azul do mar.
Vida lutada por ser vivida,
É luta ganha ou é perdida.
Beleza vista com alegria,
Tristeza pura que é nostalgia,
Na rua crua dos deprimidos,
Que os torna frios – até bandidos.
.
Do sofrimento que é emoção
Da ternura aflita do querer em vão,
À sensação incrível do sentir amor,
Inda que às vezes lacerante dor,
Mas que, atrevida, conquista a alma,
Destruindo o senso, o zelo, a calma.
As cores, os sons, os bons e os maus,
Obstáculos, barreiras, estorvos, degraus,
Caminhos retos, tortos ou com desvios,
A se percorrer serenos, ou aos desvarios,
Assim escolhemos os nossos trilhos
E neles crescem os nossos filhos.
E, como vemos, já tudo existe,
De nada importa se alegre ou triste,
A arte é viva e à frente está,
Em qualquer ponto… Aqui ou lá,
É só o homem que a quer achar
Saber ver, saber sorrir e saber chorar.
Mas, dentre eles, há o que sente
Em cada coisa, vida ou mente,
Tudo que emana da dor profunda,
E o que emerge do amor que inunda
A alma que é aura do que é ser
Humano herdeiro de aqui viver.
Aos mais sensíveis Deus deu os dons,
Pra extrair da vida os sons,
Somando notas, enchendo pautas,
Em suas mentes as melodias.
Alternam acordes em sinfonias,
Navegam músicas de que são nautas.
Outros, então, do mundo as cores
Prendem nas telas em seus matizes,
Com seus pincéis e seus pendores,
Dão vida à vida, criam raízes,
Tiram do tempo os elementos,
Pintam a lida em seus momentos.
E os poetas…O que eles fazem?
Juntando letras, palavras, frases,
Escavam o íntimo do que existe,
Lá encontrando o que é triste,
Desde o complexo dos incapazes
Ao orgulho tolo que os tolos trazem.
Com o amor produzem versos,
Muitos sofridos se de amor reversos,
Rima constante de uma paixão
É, quase sempre, uma traição.
Amam e odeiam em fantasia,
Sentimentos gêmeos numa poesia.
Mas como expor sem ter receio,
Tudo o que sinto em devaneio,
Tudo o que explode em minha mente,
O que flutua num mar ardente,
Das coisas da vida, que a vida mostrou,
Do sentimento puro que ainda restou?
Só mesmo tentando ser o que não sei se sou.
Com a cabeça mais aliviada após ter escrito esta ode, lembrei-me de toda a minha saga, desde o momento em que vi, no resultado da angiotomografia coronariana que detectara o meu problema e que, além do laudo escrito, exibia imagens quase tridimensionais do meu coração, até a minha chegada à UTI depois de concluído o cateterismo por que passara durante duas horas.
Importante realçar que, ao longo de toda a intervenção, o paciente deve permanecer acordado e conversando com os médicos, que, só assim, podem acompanhar as suas reações. O procedimento fora levado a cabo por dois jovens médicos especializados em angioplastia, assistidos pelo meu cardiologista já cinquentão, que me acompanha há trinta anos, os quais, para manter-me acordado, permaneceram conversando comigo, contando piadas, mentiras e verdades reciprocamente, enquanto me solicitavam que desse notas de um a dez para as dores que as manobras intra-coronarianas provocavam. Dai resultou…
A REFORMA
De repente, a foto de um coração…
Parece vivo, de tão perfeito,
Sua cor vermelha dá a dimensão,
Do amor que pode caber no peito,
Mas algo ali não vai bem não…
Uma coronária está com defeito.
Que susto! Será? O que fazer?
Era verdade, dúvida não havia
Tão clara a imagem que a máquina fria
Levara o médico a descrever:
– Obstrução do fluxo intra-luminal,
Devemos ir para o hospital.
A disfarçar minha agonia,
Brincava eu com os dois meninos,
Que, expertos, usavam a tecnologia,
Sob os olhos atentos, quase felinos,
Do antigo mestre ali presente,
Amigo constante e competente.
E entre piadas e anedotas,
Frases jocosas, algumas lorotas,
Rasgaram um cano na inguinal,
Por ali passando o material,
Que qual vassoura me varreria,
Toda a gordura que na veia havia.
Pra completar, ainda fariam,
Pelo buraco que em mim abriam,
Entrar a mola que impediria
Que aquela veia que me maltratava,
E que a intervenção recuperava,
Voltasse a encher de porcaria.
Dez, nove, oito… até chegar a três,
Eram as notas que eu dava,
À dor no peito que eu sentia,
Enquanto a equipe ali trabalhava,
Minorando sempre a cada vez,
Que uma vitória se conseguia.
As hábeis mãos da meninada,
A trabalhar no caminho estreito,
Foram cumprindo sua missão:
Da placa dura não sobrou nada,
Deixaram novo meu velho peito,
Emocionando o quase ancião.
São dois moleques e um cinquentão
Que reformaram meu coração,
Com competência e maestria,
Sem se esquecerem da alegria,
Tornando novo o que era antigo,
Fazendo de mim, pra sempre, um amigo!
A minha paixão pela vida no campo levou-me a ter, ao longo da vida, algumas propriedades rurais, onde sempre criei cavalos e cães. Dentre os muitos que tive, todavia, dois tiveram especial significado para mim: um garanhão de pelagem dourado-acobreada chamado Alazão (o mesmo nome pelo qual a pelagem é conhecida entre os criadores), que comigo permaneceu vinte e seis anos, até morrer dignamente no pasto do haras que possuo, e um pastor alemão chamado Hulk, exemplo único de inteligência, fidelidade e lealdade, que acabou por falecer aos nove anos na minha sala de trabalho em São Paulo. Grandes passeios realizei montando o Alazão e tendo a companhia do Hulk, verdadeiros e excepcionalmente queridos amigos, que
mereceram que eu, entre lágrimas, lhes dedicasse uma singela e inocente poesia escrita em linguagem interiorana, ou caipira, como queiram, que denominei…
A TRINCA
Amigos leais, dois tive na vida:
Achei o primeiro marchando na estrada,
Inda potro que era trazendo no lombo
Um bom professor, um bom cavaleiro,
Que a ele ensinara os primeiros passos.
Os truques, os dengos, o galope da lida,
De novos traquejos precisava mais nada.
Já tinha a sabença de que erro faz tombo,
Sentia o perigo até pelo cheiro,
Coragem, vigor e medos escassos.
Coração salteando, amor de primeira,
Cavalo de cobre minha vista encantava,
Jogava pros lados as patas dianteiras,
Seguindo seu rumo cabeça empinada,
Levando no arreio vaidoso peão.
E agora lhe conto uma história faceira
De como encontrei ali mesmo onde estava,
Na beira da via, comendo poeiras,
Do meio do pó, brotando do nada,
A cruzar meu caminho o meu garanhão.
Enquanto o ginete mal se mexia,
Meus olhos seguiam o lindo animal.
Soberbo, altivo, com toda nobreza,
Pra mim caminhava, as ventas soprando,
Me olhava, me via, bulia comigo…
Quanto quer, camarada, pela montaria?
Pedir muito, aceito… nem caro faz mal,
O cavalo é meu, com toda certeza.
Agradeço ter dele ficado cuidando,
Mas ele nasceu para ser meu amigo.
Daí para diante ficamos unidos,
Ao longo do tempo nunca nos separamos,
Andamos, corremos, até encontrar,
A quem só faltava a nós se unir,
Amigo canino fechou nossa trinca.
Ao ver lá na toca os cães escondidos,
Dos dois da ninhada que nós apartamos,
Um logo mostrou que queria me amar,
Pulando, brincando, deitou a latir,
E se ofereceu… Co’amor não se brinca.
Leal e fiel, herói companheiro,
Bastava o carinho da minha presença,
Seguia meus passos por onde eu ia,
E juntos vieram com muito carinho
Adornar meu destino, o Hulk e o Alazão.
Durante suas vidas os amei por inteiro,
Mas já me deixaram, só resta uma crença,
Formaremos de novo nossa trinca um dia,
Nos prados etéreos, em novo caminho
Num galope feliz, eu, meu cavalo e meu cão.
Bons professores de Português despertaram-me o interesse pela construção de textos poéticos a partir da observação do ambiente, do dia a dia, da natureza, das relações humanas e, sobretudo, das percepções emocionais, a tal ponto que, aos doze anos, ousei, dentro dos meus limites de pré-adolescente e inspirado pela primeira e mais óbvia musa que todos temos, homenagear minha mãe com a minha primeira e ingênua poesia…
MÃE
Palavra doce, fácil de pronunciar
Palavra singela que exprime amor,
Amor de mulher, sim,
Amor de mulher por algo que é seu,
Amor sublime de alguém que ama
O fruto de suas entranhas,
O fruto que lhe rasgou o seio,
Para ter a luz.
Fruto que é toda sua alma
E que é um pouco do seu ser.
Mãe, que não é simples palavra,
Mas uma existência,
A existência mais sublime,
Que Deus pode criar.
Trouxe esta poesia a este livro (melhor seria chamá-lo livreto?), não obstante a sua simplicidade e inocência, por que, realmente, foi a primeira que fiz e uma das poucas daquele tempo que foram guardadas. Mas, não pretendo seguir uma ordem cronológica entre as que escolhi para trazer a esta despretensiosa obra.
E aqui é preciso destacar que, a partir dos doze anos, muitas foram as poesias que fiz e que, por não me preocupar com a sua memória, acabaram se perdendo. Ainda com a mesma motivação e igual ingenuidade de versos, talvez, pouco mais tarde, ainda restou…
HOMENAGEM ÀS MÃES
Enquanto a rosa perfuma as mãos de quem a despedaça,
U’a mãe banha com lágrimas de amor
Os desgostos causados pelos gestos impensados
De seus filhos.
Parte 2 – A musa
“Na minha mão o coração balança
Quando ela se lança
no salão”
(Chico Buarque)
Como adolescente e jovem romântico e, por esse mesmo motivo, muito atento aos predicados do sexo oposto, muitas vezes me servi de versos rápidos, criados improvisadamente e inspirados em musas ocasionais, invariavelmente, passageiras, mas sempre na busca de conquistas, vez que, naquela época, todas as moças apreciavam os ditos poéticos.
Abençoado por uma habilidade acima do comum para dançar, dela tirei proveito igualmente no âmbito da sedução, posto que, da mesma forma, as meninas, quase sem exceção, sabiam bailar e prezavam a dança de salão.
Da valsa ao tango, eu conseguia dominar todos os ritmos e com isso tinha a chance de escolher as mais belas jovens e ser por elas aceito, durante os bailes que, fossem de formatura, de aniversário de quinze anos, de debutantes, eram constantes naquele tempo.
E foi assim que eu conheci a melhor parceira de dança que já tive, a mais bela mulher, mais linda alma que a Providência me proporcionou e que acabou por se tornar a inspiração constante para os meus poemas e, até hoje, dona do meu coração.
Para ela foram os mais românticos (talvez, literariamente, os mais ingênuos), desde os primeiros, sempre motivados pelo amor e a admiração, como este, também singelo e inocente, escrito no verso de um cartão de visitas de estudante ao lhe presentear com uma orquídea, mas brotado de um peito perdidamente apaixonado…
AMOR LILIANA
Tudo o que de singelo tem a rosa,
Tudo o que de belo tem a orquídea
Reuniu-se em um nome de flor,
Flor que é mulher,
Mulher que é amor,
Amor que é
LILIANA
Na sequência, o jovem sonhador, cada vez mais encantado e, como sempre, em dúvida sobre os seus eventuais dotes de poeta, buscou homenagear a musa com a poesia que transcrevo, inclusive, com a ressalva em parênteses atirada no momento da entrega…
PRINCESA, EU TE ADORO!
(Quero deixar claro que eu nunca fui um poeta. No entanto, o que você vai ler em seguida veio de dentro do meu coração e, sem qualquer retoque, eu transpus para o papel)
Ontem estive a pensar:
O que seria de alguém,
Sem outro alguém na vida…
Que beleza teria o luar?
E a flor que beleza teria?
Ontem estive a pensar:
Que triste seria esse alguém,
Sem outro alguém na vida,
Alguém que chorasse de dor
Em véspera de despedida.
Ontem estive a pensar:
Que sorte eu tenho querida
E a Deus agradeci a ternura
De me proporcionar a ventura
De ter você em minha vida.
No entanto, pouco tempo depois, ao perceber que estava perdidamente apaixonado e, em função de minha personalidade aventureira, pressentir que os meus dias de conquistador estavam completamente comprometidos, cometi uma maldade que, até hoje, me faz sofrer quando me lembro, rompendo o namoro, que começara pouco tempo antes.
Contudo, antes do final daquele ano, por um estratagema muito bem montado por ela, voltamos ao namoro que ainda perdura. Dai resultou esta poesia…
PRINCESINHA
Um ano se foi…
Com que tristeza me lembro,
Como sofri por te magoar.
E me esforço para não pensar,
Pensar que um dia, de noite,
Após muito meditar,
Tornei minha fala um açoite,
Fiz dela uma adaga vulgar
Para o teu coração machucar.
E choro…
Choro por não saber como dizer,
Se naquele dia eu a fiz sofrer,
Quem sabe se para evitar
Que viesse nosso amor a morrer.
E agora…
Sim, agora apesar do que fiz,
E ainda daquilo lembrares,
Princesa, tu me fazes feliz.
Mas eu hei de fazer-te esquecer,
Procurando de alguma forma tirar
Das flores o olor e a beleza,
Das cores o esplendor do matiz,
E com eles tua vida adornar.
Jamais me cansar eu irei
De clamar, de pedir, de chorar:
Princesinha, perdoa-me…
Pois se vivo é só pra te amar!
Muitas outras poesias vieram depois, já que seus olhos negros e brilhantes, como jamais vi outros na vida e — para não contrariar a minha personalidade “donjuanesca”, posto que seria injusto não revelar — também e especialmente seu rosto de anjo e corpo de sereia, acabaram por me escravizar totalmente, ao ponto de me manter cativo até hoje e cada vez mais enamorado.
Entre elas, penso que algumas merecem ser lidas, como a próxima, entregue com um “bouquet” de flores, como um pedido de perdão por algo errado (acho que eu me esquecera de chamá-la por telefone) que eu houvera feito.
ARREPENDIDO
Passou uma hora inteira.
Passou uma noite inteira
E nem quando o dia chegou,
Os pássaros cantando alegria
Em manhã de pura magia
A voz esperada a chamou.
A voz esperada era a minha
Que se tornara mesquinha
Tão cheia de egoísmo estava,
Que nem por instante lembrava
Da lagrima a rolar sozinha,
Angustiando teu coração.
Ora, arrependido e tristonho,
Procuro apagar o mau sonho,
Mesmo sabendo em meu íntimo,
Quão ínfimo pode ser neste átimo
O lamento que ora te exponho
E que talvez não mereça perdão.
Ou este outro soneto feito em razão do esquecimento de um Dia dos Namorados — e, posso assegurar sem nenhuma dúvida, o único durante todo o nosso longo convívio. Embora não lembrado de manhã, ainda assim, o foi na própria data…
DIA DOS NAMORADOS
Esqueci, pra falar a verdade,
Não lembrei…. Como saber por quê
E não posso invocar a idade,
Já que em ti toda a vida me vê.
Parabéns, tantos dias passados,
Todo dia é seu dia, amor,
Mas, perdoe, se por leve torpor,
Perdi, justo, o dos Namorados.
Por vencido, jamais vou me dar,
Disfarçar não é coisa que eu faça,
Em direto, só te quero falar
Como é bom teu olhar me dizer,
Ternamente, sem rancor ou pirraça:
– Te perdôo, mas é bom aprender!
E mais esta, que revela uma certa possessividade a que estou permanentemente submetido, vez que, mal-acostumada, ela exige assíduas e constantes demonstrações de amor…
NÃO BASTA REGAR…
Não basta regar… precisa inundar.
Pranto é sinal, é lamento acenado,
Pela flor mais fácil de amar,
Ao coração por ela aprisionado,
Querida que é… A mais exigente,
Nunca por ser de amor carente,
Dona e senhora de toda a atenção,
Envolve em encanto o pobre varão.
Não basta regar… É o que ela diz,
Fazendo beicinho, parece infeliz.
Humilha o cativo de seus olhos brilhantes,
De onde, por feitiço, brotam líquidos diamantes,
Luzes ardentes de intensa magia,
Fazem o escravo recusar alforria,
Posto que o álveo das lágrimas da flor
Nasce do âmago de seu imenso amor.
Algumas vezes, um simples almoço, fosse ou não no Dia dos Namorados, culmina por despertar-me improvisada carícia que, quase sem perceber, converto em poesia, como é o caso desta que foi escrita rapidamente num guardanapo de papel, há poucos anos:
NAMORADA
Navego no mar desta vida,
Ainda que nave não tenha,
Mas só de sentir-te, querida,
Onda linda do amor que me venha,
Rara pérola a ornar minha senda,
A mais cara paixão que conduz,
Dando força qual seja a contenda,
Afinal, dos meus olhos és luz!
Mereceu minha musa preferida inúmeras outras declarações de amor traduzidas em escritos, ofertados em datas marcantes ou, simplesmente, à guisa de carinho indelével. Por exemplo, este, que relembra o meu prazer ao abraçá-la a dançar…
NOS TEUS BRAÇOS
Um som, mais um e outro mais
A soma, o tom, a harmonia…
Da alma para a história e seus anais
A música, Divina parceria
Que envolve, aconchega e alicia
Homem, mulher… lá fora a lua
Corpos, corações e a melodia
Dentro, pelo salão o amor flutua.
Dançar não se aprende, conjuga-se
Se a musa enfeitiça e inebria
O toque, o perfume e inunda-se
O peito do condutor… é alegria.
Um sonho, um devaneio, a sensação
Nas voltas, nos compassos a vida,
Teus olhos, teu respirar… uma canção
Amaste-me, sempre a dançar, querida.
Ou ao homenageá-la, como efetivamente merece, em um Dia Internacional da Mulher…
INTERNACIONAL
É natural, é sobrenatural!
No amor é transcendental,
Abriga o bom… suporta o mal.
E até na dor é fenomenal,
Da perda faz bem, da doença, a cura real.
E luta, e cai, mas levanta e vai…
Como ela, ninguém tem força igual.
Escolhida, gera a vida, produz o ser
E, num milagre, se dá por inteiro
A todos e a cada qual.
E, além de tudo, nada influi a cor,
A raça, nem mesmo a condição social.
É linda, é brava, é mansa, é suave,
Não importa aonde vá,
Não importa onde viva,
É mulher… E isto é internacional.
Ou, ainda, a poesia que revela a sua permanente conduta como criadora de empresas, construtora de negócios, organizadora de equipes, competente, calma e constante orientadora de todos que a cercam, alma acolhedora e verdadeira professora…
PROFESSORA
É uma mulher
Jovem, pequena, formosa,
Às vezes brava, outras dengosa.
E, no entanto, é forte,
Obstinada – sabe o que quer!
Mas, quem é essa mulher?
É a mãe que gerou filhos,
Construiu um lar
E, agora, vai perseverar,
Para, do nada, uma empresa criar.
Não importa o tamanho
Do obstáculo a transpor,
Tudo que faz é com muito ardor,
Leite de pedra ela sabe tirar,
E sempre pronta a montar um novo rebanho.
Mas, o que fez essa mulher?
Construiu um abrigo…
E para muitas famílias.
Acolheu o distante e, também, o amigo,
Que do albergue sustentam filhos e filhas.
Tal qual a pastora
A cuidar das ovelhas,
A nenhuma quer ver apartar-se das outras,
Sejam novas ou velhas,
Seja negra ou loura.
A todos atende com muito carinho,
Dissipando dúvidas, mostrando o caminho.
Não há hora nem tempo para tal lutadora,
Jamais desviou-se de seu nobre destino,
Com ela aprendemos – é encantadora.
E agora tecemos esses versos de um hino,
De tantos alunos sincera homenagem,
Àquela que é e sempre foi vencedora,
Alma dourada, conselheira e pajem,
Exemplo de vida… querida professora!
E há esta outra poesia, que na minha pretensão é lírica e, como sempre pretendi, foi transformada em canção, musicada por meu parceiro Nilson Ribeiro…
QUEM ME DERA EU PUDESSE…
Quem me dera eu pudesse…
Nessa vida tropeçada
Tendo tanto ou mesmo nada
Do caminho que ela desse
Conhecido um pouco mais.
Quem me dera eu pudesse…
Ter da dor colhido a lágrima,
Que de amor foi derramada,
E de fascínio ou por mágica
Em cristal ver transformada.
Quem me dera eu pudesse…
Esquecer o que é mágoa
Tendo vida a cada dia
Só amando e sendo amado
Quem me dera eu pudesse,
Nessa vida tropeçada,
Ser seu único pecado.
E também mais esta, na verdade uma descrição do momento e da forma como me rendi aos seus encantos e lhe pedi em namoro, ao som da música, com ela em meus braços e, leve como pluma, a dançar pelo salão.
SALÃO DE BAILE
Vozes, burburinho, fumaça e perfume,
Um olhar… E o jovem o pedido assume:
Quer dançar?
E a música, cumplicidade divina,
Os passos do menino conduzindo a menina,
Ao abraço começa a embalar.
Dois pra lá, dois pra cá,
Coração contra coração… Calor adolescente,
Passe de mágica, paixão incandescente:
Quer namorar?
Tremem os joelhos, o momento ali está,
Não dá pra esperar.
Ansiosos e trêmulos,
Calor, suor, inebriante melodia,
Deslizando superam êmulos,
Almas a se reconhecer… Que alegria!
Num repente, vidas a se entrelaçar:
Já antes viveram e, como gêmeos, vão recomeçar…
E acrescento este soneto que fiz mais recentemente, num momento em que, contemplando-a, admirava a sua beleza, que nada mudara e só enriquecera, e que, enfim, me envaidecia…
SONETO
Como prender nestas linhas
Os versos que agora cometo,
São letras e frases só minhas,
Espremidas num curto soneto.
Lembrar da beleza de outrora,
É fácil, pois nada mudou,
Trouxestes as cores da aurora,
A iluminar o que de mim restou.
Teu jeito e teu sabor de menina
Conservas como plácido manto
E a minha hoje fraca memória
Não olvida de que nessa história,
Tu, mais do que musa, foste sina
E, acima do amor, és lírico encanto!
Igualmente, jamais poderia deixar de louvar um de seus principais predicados: o sorriso. Sempre constante e luminoso, acariciante benção para mim, para nossos filhos e netos e para todos que dela se aproximam, impressionou tanto ao meu falecido pai que, a ela se dirigindo, não se cansava de dizer: –Deus te conserve o sorriso!
TEU SORRISO
De repente, a luz clara,
As cores, reflexos… brilha a calma,
Pulsa um quasar, batendo lento
E as coisas que não vejo, apenas sinto
Tocar aquela luz ainda tento.
A mão, percebo, não a alcança
Lume, clarão, fulgor intenso,
É mais que chama…
Pois chama amor imenso.
O toque, o calor, o gosto aceito
Em meus lábios da luz etéreo mel
Que brota de tua boca, o lindo céu
De astros brilhantes e contidos…
Da alma a fé, a força, a energia,
Teu sorriso a mais bela alegoria
Para Deus, que em face dos pedidos,
O conserva, acalenta e acaricia.
Mesmo quando algo nos oprimia, quando os obstáculos se afiguravam mais altos do que nossos saltos podiam ultrapassar, em momentos nos quais fomos traídos e quase nos desesperamos, ela sempre manteve a força, a esperança e a fé. Por isso sempre foi vencedora, o meu esteio…
TROPEÇO
E se eu tropeçar
E chegar a cair…
E se o medo chegar
E vier me oprimir…
E se eu não enxergar
E minha força falir…
Onde vou me apoiar,
Que caminho seguir?
Já começo a chorar,
Mas não vou desistir…
É preciso lutar,
É preciso insistir…
E eu quero vencer,
Superar meu temor…
Sei que ainda vou ter
Muito chão, muita dor…
Mas o mal vou romper,
Com a força do amor…
Que em ti, posso crer,
Buscarei, minha flor!
Outra ainda só para ela, vai no mesmo sentido…
VALENTE
De onde vem tanta força, capaz de fazer rir, e de sorrir,
Entre lágrimas,
De transformar sofrimento, que machuca e corroi,
Em graça,
De não lamentar, agüentar sem gemer e, ainda, suportar,
Mesmo a dor lancinante?
É pendor da alma, é dom do espírito, capaz de extrair,
De dentro das lágrimas,
O atributo do ser, escolhido por ser o que não sente que dói
O mal que se lhe faça.
É o centro do mundo, o coração de mãe, pronta a dar
Amor puro e aconchegante.
Brava, persistente, guerreira mesmo, que não para de ir,
Ainda que em lágrimas,
Prosseguindo consola aos que por ela sofrem, e constrói…
E ergue a taça,
Pra todos que a querem, que a amam de muito amar,
Ninguém é mais forte, nem mais amante…
Além de valente!
E há mais esta, tantas são as facetas que ela me revela em um instante quantas são as poesias que brotam…
VITORIOSA
Nada foi fácil, nem mesmo o começo.
Levanta e avança a cada tropeço,
Sofrer não a intimida,
Só vale a esperança,
O futuro, a vida …
O resto é lembrança.
Não há obstáculo, nem dor
Ou revés que a vença,
É forte, é viva, é linda, é cor,
É luz, é amor, é paz e é crença.
Prossegue com garra, é pura labuta,
Não verga, não cai, não foge da luta.
A tudo resiste
E a todos alenta,
Nunca desiste,
Mamão com pimenta.
Exemplo de fibra,
Encantadora e poderosa,
Com tudo ela vibra:
É sempre a vitoriosa!
Com e apesar da doçura, existe nela uma personalidade forte, extremamente, teimosa, que a leva ao domínio de todas as muito raras e sempre rapidamente superadas discussões, o que obriga este súdito à repetida submissão.
INEXPLICÁVEL
Inexplicável!
Tudo vai bem
E, inesperadamente,
É discussão…
Como se só ela me amasse
E eu a ela não…
Inexplicável!
Como pode ser,
Como pode acontecer?
É confusão…
Como se só ela me amasse
E eu a ela não…
Inexplicável!
Se tanto nos gostamos,
Por que, sem motivo, brigamos?
É exploração…
Ela sabe que se não a amasse,
Não caia de joelhos, não…
É adorável!
Também inexplicável, até pelos especialistas consultados, é uma alteração paulatina da pigmentação da íris dos seus olhos, que, de negros como ébano, ao ponto de inspirarem a poesia…
OLHOS NEGROS
Foi quase de brincadeira
Que te encontrei faceira,
Teus olhos a me envolver
E quase sem perceber,
Ou pensar, ou querer
Mergulhei num instante
Em negro mar brilhante
Para dele não mais sair
Posto que me fez sentir
Que se quisesse respirar
Só dentro daquele olhar
De pérolas negras a sorrir,
E que o sol inda iria pintar,
Eu poderia conseguir…
Foram se transformando e vão se tingindo de mel, justificando a criação de outra poesia a que chamei…
ESSES DOURADOS OLHOS NEGROS
Dois olhos negros que falam, num rosto de anjo…
Eu os vejo e não entendo,
E eles brilham como se tivessem um fogo interno…
E eu os vejo, mas não entendo,
E, no entanto, sinto-me cada vez mais atraído.
Aí atino que o ébano daquele mirar pertence a u’a menina,
Mas com rosto de anjo…
E os dois pequenos sóis negros reluzentes
Permanecem apontados para mim…
Enquanto eu, encantado, de tão lindo olhar
Não consigo desviar o meu olhar atônito.
Então, pouco a pouco vou notando…
Que, daqueles olhos negros de menina
– Ou será um anjo?
Faíscas e centelhas brotam e me alcançam
E, como dardos, cravam-se em meu coração…
Mas, que estranho…
Eles não ferem, antes afagam e envolvem…
São dardos de amor!
E suavemente, bem devagarzinho, torno-me escravo
Daqueles olhos negros, do seu brilho incomparável
E de sua dona,
Que, logo percebo, não é um anjo…
É uma linda alma revestida por uma bela mulher.
Aqueles cometas reluzentes nascidos do negro daqueles olhos
Submeteram-me, definitivamente!
E assim começou uma doce escravidão,
O tempo não passou
E já tantos anos vão…
Olhos negros que falam, condutores da minha existência,
Foram a luz a guiar de nosso amor os frutos,
A chama a aquecer nossos dias.
Força meteórica que nos impulsiona e encaminha,
Ao ponto de impressionar até a Deus,
Que, como que abençoando a alma escolhida,
Ungindo de mel as suas lágrimas,
Tingiu de ouro os olhos negros da minha vida.
Às vezes me questiono como posso me inspirar em coisas tão discretas, que só mesmo a existência de uma musa pode provocar. Ainda recentemente, ao observar que a minha, naquele dia, calçava lindas sandálias douradas, trouxeram-me elas estas imagens mitológicas que me levaram a criar versos enquanto conduzia o veículo em que estávamos, ditando a ela que gentilmente os transcrevia…
SANDÁLIAS DOURADAS
Essas sandálias douradas,
Por seus meigos pés adornadas,
Fazem lembrar algo mítico
No coração deste crítico,
Que a teus pés sempre está…
Sem dúvida foste vestal
Em algum templo do Quirinal
Entre as deusas da velha Roma,
Das quais ainda tens o aroma
E cuja beleza trouxeste para cá…
Mas não te viu o Lácio apenas,
Do mesmo modo conheceu-te Atenas
E, como grega, pelo Olimpo andaste
E Isis que foste, no Egito desfilaste,
Eis que só pode tua cor ser de lá…
Mas, se entre deuses não pude tanger-te,
Sendo simples e pobre mortal
Fadado a agir e sentir como tal,
Só aqui, meu amor, pude ter-te,
Pois ao meu lado teu calor ora está.
Tratar o amar com respeito, valorizar a paixão, perceber a pureza, a simplicidade e a beleza do puro e humano ato de amor entre amantes verdadeiros, também é missão do poeta. E nada mais lindo, romântico e…
SENSUAL
Procuro-te e te vejo,
Nua em teus pensamentos,
E me provocas devaneios
Quando, ao mirar teus seios,
Enrijeces meu desejo,
Suavizando meus momentos.
Teu perfume me inebria, enlouquece…
Aproximo-me e… acontece:
Minha mão, trêmula de ansiedade,
Toca tua pele macia, que é só vaidade,
E teu corpo percorre nervosa,
Causando-te arrepios, dengosa…
Meus lábios se unem aos teus,
Que, molhados como os meus,
Estimulam nosso senso,
Criando cúmplice consenso,
A manter nossos corpos unidos,
Pelo amor, e pelo calor vencidos.
Tuas lindas pernas macias,
Lânguidas e entreabertas guias,
Acenam-me o caminho,
Pois queres alojar em teu ninho,
Meu forte e apaixonado vigor,
Que penetra teu âmago com ardor.
Escalo teu monte, Vênus que és,
Ânsia e afeto e me ponho a teus pés,
Beijo-te e sorvo teus próprios ruídos
Enquanto mesclamos os nossos fluidos,
Amando-nos tanto, sem culpa ou complexo,
Dúvida não há: somos o côncavo e o convexo.
Mas um poeta tem sempre, por obrigação, que falar de amor e de…
SEDUÇÃO
Não se pode dizer que a conquista
Seja vista como prêmio ou troféu,
Pois a poucos se confere o papel
De viver como hábil artista
Dominando o pulsar da paixão
Percebendo os sinais escondidos,
Disfarçados, camuflados, perdidos
Indecisos entre um sim e um não…
Entender que o andar pode ser,
Combinado aos modos e trejeitos,
Como livro que se lê bem aberto
A mostrar o caminho mais certo,
Ensinando os meios e os jeitos,
Prá alcançar o mais belo do ser,
Que por todos os poros exala
O olor do amor, que se cala…
Captar o chamado de hormônios
Volatizados num simples olhar
Que reflete o calor lá do centro
Labaredas ardendo lá dentro
Onde está o desejo a queimar…
E então devolver feromônios
Através de recursos singelos
Entre letras e sons paralelos
Só alguns são capazes de ter
Esse dom de instilar o prazer
Essa coisa de querer e sentir
Como é bom à mulher conquistar
Como é lindo vê-la sucumbir
Ao domínio do seu coração…
É essa a arte da sedução
O poder de se fazer amar…
Esgrimista das armas da vida
Do romance com alma sentida
Cavalheiro que sabe entender
O que deve a mulher merecer
O carinho, a lhaneza, o respeito
Que não mudam o velho conceito
De que a ela se trata como flor
E, aqui, é mestre o homem sedutor…
O u de…
SEDUZIR
Ousar…
E provocar arrepios
Com o olhar
Eriçar os pelos
Insinuar o mal-feito
Que, quando bem feito,
Faz arfar e sensibilizar o peito…
Acenar sensações,
Invocar emoções
A umedecerem
Todos os lábios
E os aquecerem
Desencadeando a paixão…
E vencer qualquer não
Insuflando o desejo
Que faz querer beijo,
Tremer os joelhos,
Sussurrar nos ouvidos
Como se fossem conselhos
E o alvo atingir
E só então sentir
Como é bom seduzir…
E como não lembrar a…
PRIMEIRA VEZ
Ao pegar a tua mão
Os instintos a aquecer
Adrenalina no coração
E as pernas a tremer…
Como posso esquecer?
Teu corpo junto ao meu
O desejo que nos venceu,
O calor que nos fez ver…
Naquele fugaz instante
Peito em arfar constante
O amor que ali se fez
Cederas ao meu anseio,
Não era mais devaneio…
Foi nossa primeira vez.
Parte 3 – Cotidiano
“O acaso não tem pressa”
(Paulinho da Viola)
Há algum tempo, ao transcrever a poesia “QUEM ME DERA EU PUDESSE…”, pensei em, “quem me dera eu pudesse”, converter seus versos em canção. Já aconteceu. Mas duas outras poesias por mim criadas acabaram por chegar a tal destino, musicadas que foram igualmente por meu amigo Nilson Ribeiro. A primeira…
ESPERANDO A CHUVA PASSAR
Esperando a chuva passar,
Perdido no teu olhar
Tudo para mim é prazer,
Só de pensar que te ter
Foi dádiva demais pra mim,
Mas, inda bem, que Deus quis assim…
E as gotas continuam a descer
Na janela eu as vejo escorrer
Não tenho pressa, eu posso esperar
E nos teus olhos ver a chuva passar…
E aqui cabe um parêntese, valendo referir que esta poesia foi do, mesmo modo, escrita num guardanapo de papel, num restaurante de São Paulo, onde acabáramos, eu e ela, de almoçar e, em função do temporal que caía, tivemos que esperar a chuva passar.
Nesse mesmo almoço, em outros dois guardanapos, e sempre inspirado por frases que ela pronunciava, ainda escrevi…
BRUXARIA
Não importa o que você quer
Sem artimanha, não há mulher.
Dominam elas as poções
Que escravizam corações.
São rainhas da alquimia,
Mestras em bruxaria,
Produzem verdades trágicas
Nas artes da conquista,
Em cada uma, uma artista…
São bruxas, são mágicas,
Mas é preciso reconhecer,
Que só uma consegue ser,
Com seu jeitinho e à sua maneira,
Minha única e linda feiticeira.
E a outra foi esta, feita em homenagem à Cidade de São Paulo, que aniversariava naquele dia de chuva…
SÃO PAULO
Neste lugar eu nasci,
Aqui eu brinquei e cresci,
Namorei e encontrei o meu par
E com ela montei o meu lar.
Tive filhos e já tenho netos,
Em São Paulo construi o meu teto…
Cidade rica, onde o rico é mais rico
E, infelizmente, o pobre mais pobre,
Mas é aqui que quem procura descobre
Que é só lutar e tudo aqui se conquista,
Enche meus olhos e não a perco de vista,
Tem seus defeitos, mas é nela que eu fico…
A minha terceira poesia musicada pelo Nilson Ribeiro foi…
PRISÃO
De minha vida fugiste,
Sem dó tu me abandonaste…
Não importa.
Se todos os meus dias desfiguraste,
Mesmo que me mantenhas tão triste,
Não estás morta…
Fazes parte do que vivo,
És pedaço da minha existência…
E traição…
Para o perdão não há motivo,
Tu não mereces clemência
E já não me podes dizer não,
Posto que és só maldade,
Eu, ao de ti sentir saudade,
Tenho-te presa no coração…
Outra com pretensão a canção acordou-me de madrugada já, quase pronta, como modinha caipira…
MELHOR DE TUDO
(Modinha Caipira)
Melhó de tudo é se amá
Passá a vida a sorri
E se no caminho encontrá
A pedra prá tropeçá,
Dá a vorta nela e segui
Até co’amor se topá.
Melhó de tudo é se amá
Mas se num dé prá escolhê
Vamo vê a frô que brotá
E frô é bom de gostá
E se ela vem nos querê
O bom de mais é se amá.
Melhó de tudo é se amá
Nem que nois tem que sofrê,
E ninguém sabe por que,
Que a dor de amor que se vê,
Por mais que doi vai pará
Só cum beijinho d’ocê.
Melhor de tudo é se amá…
Também em linguajar interiorano ou caipira, escrevi uma poesia que descreve a casa que nos abriga e aos amigos em nossa propriedade rural e essa, algum dia, quem sabe, poderá ser transformada em moda de viola…
BARRACO NO MORRO
É no sopé do morro, bordeando a floresta,
Onde a franja do mato cai por riba da cerca,
O lugá que parece que tá sempre em festa,
E a vida não deixa que ali nada se perca.
Ali memo encontremo nosso canto de terra
E rezemo pra santa ele abençoá.
E enchemo de pranta, rodeando a serra,
Prá cum verde e cum frô nossa vida enfeitá.
Lá prantemo uma casa tão simplinha e singela,
E pra Deus num esquecê, levantemo a igrejinha
E uma pedra que é rocha nós deixemo limpinha,
Pra servi de escada e chegá na capela.
Protegendo nois tudo, Santa Rita oiano,
Tudo o que nois fazemo, trabalhano o brincano,
Com desvelo ela cuida de tudo os que ali mora
Mais se as coisa aperta, lá vem Nossa Senhora!
Lá os pássaro num espera nem nascê a alvorada,
E começa a cantá que é prá nois acordá,
É o barulho dos bicho tudo em nota marcada,
Eles qué companhia… é prá nois levantá.
Nosso canto, nosso ninho é o nosso barraco,
É pros filho é pros neto, é um grande abrigo.
Lá nois gosta de está, de guardá nossos caco,
Gosta de namorá e curti os amigo.
Mais num é quarqué um que nóis vai escolhê
Prá entrá na cabana que nois aprecia de tê.
Tem que entrá bem no peito dum jeito mansinho,
E ali nele ficá só com muito carinho.
E agora nois tem que uma coisa confessá:
Nossa casa tá viva e nunca mais vai morrê,
Só porque dos amigo nóis tiremo um pouquinho
Do amor que eles tem prá alimentá o nosso ninho.
E por inspiração em sentimentos de minha mulher, dois outros poemas se ligam ao nosso cantinho rural. Dizem eles respeito a algumas árvores por ela ali plantadas…
FLAMBOYANT
(A ÁRVORE QUE EU PLANTEI)
De que cor são essas flores?
Mesclam elas tantas cores
Em um mesmo matiz
De que cor são essas flores?
Pois do ouro ao vermelho
Fazem-me tão feliz
De que cor são essas flores?
Uma copa coroando
Pétalas e folhas em explosão
Lágrimas de sereno derramando
A deixar o tronco umedecido
E, tendo por ele escorrido,
Chegam a beijar o chão
De que cor são essas flores?
De um quase vermelho intenso
Como o são os amores
E que tão bem os conheço
Pois o meu foi sempre imenso
Amor desde o começo
De que planta são essas flores?
Árvore de muitos pendores
Desde pequena muda
E que ainda meio desnuda
Eu plantei de brincadeira
Bem defronte à minha porteira
São as flores que ao vê-las
Banhadas pelo sol da manhã
Alegro-me tanto de tê-las
Adornando minha vida
Brotando da planta querida
O meu lindo Flamboyant
AS PALMEIRAS
São três reais palmeiras
E já se mostravam faceiras
Mesmo quando pequeninas
Parecendo lindas meninas
Com a ternura da infância
E toda beleza e elegância
Que mostrariam vida a fora
Todo dia e toda hora…
A ornamentar nosso jardim
Foram crescendo, enfim
Cada uma à sua maneira
Entre flores e grama rasteira
Buscando as nuvens no céu
Cada qual com seu verde véu
Mais altas, dia por dia,
Sentinelas de nossa alegria…
São três palmeiras imperiais
Que amamos sempre mais
E que seguem a crescer
Para que todos possam ver
E sentir que valeu a pena
Pois a vida ficou mais amena
Sob a sombra de suas palmas…
Por certo, elas têm almas.
Ainda por inspiração em seus sentimentos, ora voltados à sua infância e à casa de seus avós, onde um velho relógio — hoje centenário e por ela adquirido, quando, após o desaparecimento de seus parentes, os bens foram democraticamente listados e vendidos entre os descendentes, para a manutenção do imóvel — marcava as horas com suas badaladas, criei…
RELÓGIO
Velho relógio querido,
Tuas badaladas melodiosas
Trazem de volta o carinho,
Das tardes e noites gostosas,
Com meus avós em seu ninho.
Velho relógio querido,
Marcaste as horas das festas,
Das reuniões da família,
Das tias, dos Natais, das serestas
E de cada nova homilia.
Velho relógio querido,
Sempre me deste motivo
Para me lembrar do velhinho,
Que num tom bem mansinho,
Entoava um lindo “Peixe Vivo”.
Velho relógio querido,
Desde o primeiro momento
Em que meu amor escolhi,
Teu som e o teu batimento,
Embalam o bem que vivi.
Velho relógio querido,
Como é bom te ouvir ainda,
A sorte me fez conquistar-te,
Pois estavas tu na berlinda,
E Deus permitiu-me comprar-te.
Velho relógio querido,
Que marcaste o horário do trem
No ir e vir do meu bem,
Quando inda nós não sabíamos
O quanto felizes seríamos.
Velho relógio querido,
Música dos meus ouvidos,
Cada batida que dás,
Traz-me dos entes queridos,
Lembranças de amor e de paz.
Meu velho relógio querido,
Agora que te tenho tão perto,
Colhe dos meus os afetos,
Pois tuas horas… eu acerto,
Para encantares meus netos!
E por falar do tempo que passa, chega a seguinte, que ditei para a Liliana enquanto guiava no trânsito infernal da Marginal Pinheiros…
SINTO PENA…
Sinto pena…
De que não se ame mais como antigamente,
Que não se deixe navegar pela mente
O amor, como rio fluente,
O sabor imaginário de um beijo quente…
Sinto pena…
Quando vejo moços a desdenhar
Toda a poesia que há no ar
E que até se pode respirar,
Basta querer… é só sonhar…
Sinto pena…
De que não mais se aprenda na escola
O que, na rua, conheceu Cartola
Nuances de amor que se veste como estola
E no coração se fixam como se tivessem cola…
Sinto pena…
De que o amor não mais anda,
Nem voa e nem navega, enfim
Pois os jovens esqueceram Holanda
E sequer se lembram de Tom Jobim…
Sinto pena…
De sentir tanta pena
Por não mais ouvir música de paixão amena
E notar que a alma vai ficando mais pequena
Enquanto se afasta do romance de um poema…
Ainda no trânsito, ambiente familiar em que cotidianamente me enredo e não circulo , a caminho do descanso ou compromisso, evitando o clima de trovoada ou ansiedade, me rendo à poesia, como essa…
TRÂNSITO
Nas vias, na clausura de um carro
Povoado por intensos pensamentos,
Cercado de sonoros e constantes movimentos
De veículos de todos os portes
Que levam gente e as mais diversas sortes
Por ruas tortas de um mundo bizarro…
Sinto o frescor do ar condicionado
Lá fora a fumaça e a poluição,
O homem, como sempre, na contra mão,
Num constante ir e vir sem se mover,
Coisas a sentir, a sonhar e a temer.
E escuto o rádio no tráfego parado…
Imagino as pessoas, quando olho ao redor,
Fechadas em carros e as motos passando,
Perigo trazendo e perigo levando,
Lidando com coisas que da vida são temas,
Poucas as soluções para tantos problemas,
E o trânsito, enfim, é um problema menor.
E, mesmo sem querer, eu reflito:
Esse caos é bem próprio das grandes cidades
Onde os homens concentram as suas vaidades,
Onde a gente só vive em meio à ansiedade
Namorando a tristeza e driblando a maldade.
E eu atrasado e cada vez mais aflito…
Parte 4 – Filhos e Neto
“Quero colo! Vou fugir de casa!
Posso dormir aqui com vocês?”
(Renato Russo)
Nossos filhos acabaram sendo criados em um mundo cada vez mais automatizado e tecnológico, onde a poesia foi abandonando espaço para um romantismo muito pragmático, quase impermeável. Não obstante isto não signifique uma perda do sentimento ou possa revelar uma alteração na graduação do amor. Simplesmente, tornou-se mais hermético, mais solitário, mais individual.
Não se dançava mais juntos e enquanto as mulheres abdicavam de suas prerrogativas femininas, a pretexto de concorrerem em igualdade de condições com os homens (e é importante destacar que nada disso era necessário para que elas assumissem as posições de destaque que hoje ocupam), estes abandonavam o cavalheirismo, a cortesia, o próprio romance.
Todos se tornaram muito mais práticos e ambiciosos e, como corolário, passaram a envergonhar-se de se acariciar com mais assiduidade e ostensividade; de declararem o amor, que continuaram sentindo, e abandonaram, até mesmo, a delicadeza de oferecer flores. Enquanto os homens se tornavam menos amáveis, as mulheres não lhes cobravam essa mesma amabilidade. Mas, ainda assim, o amor continuou a vencer e os casais a se atraírem e a se amarem.
Três filhos tivemos, sendo que o primeiro Deus pediu de volta ainda no berço, mas permitiu que ele, sempre com rosas amarelas, as mesmas que o vestiram em sua partida, acompanhasse-nos a vida inteira.
Em todas as ocasiões importantes de nossas vidas, desde o nascimento de sua irmã, posteriormente de seu irmão, ele se mostrou presente por meio de inesperados buquês de rosas amarelas que chegavam às mãos de sua mãe. Por esse motivo, no dia em que nossa filha manifestou que, em seu casamento, gostaria de ver a igreja enfeitada com rosas amarelas, brotou-me do peito esta quase oração…
ROSA AMARELA
Mais que amenizar a dor… que não é morte
É efêmera separação, é outra sorte
As rosas amarelas sobre a pequena urna deitadas,
Fundem-se à mais pura alma
Que, em suas etéreas revoadas,
Singrando o azul, a paz, a luz …
Flutua na imensidão celeste
E, dádiva única de intenso olor,
Retorna ao âmago do próprio Criador.
Milagre de infinito poder,
Exemplo de Divino amor,
Liberando tão pura oferenda
O Senhor da vida, Misericordioso redentor,
Daquela essência extrai outro ser,
E como prenda aos corações devolve …
Menina e flor.
Junto, uma rosa: doçura, perfume e amarela cor…
Avança o tempo e outra vez,
Da mesma essência, Divino sopro…
Novo rebento, agora varão,
Mesmo carinho, mesma benção, nova paixão
E, como ornamento, delicada, inocente e bela,
Ternura e carinho como matéria,
Mais uma vez a rosa amarela.
Ao longo da vida, nas lutas, nos medos,
Na perda e na vitória.
Em todo sentido, repete-se a história
Centelhas de amor, mercê da Divina glória,
Relembrando a meiguice da essência singela
Nas mãos da mãe a rosa amarela.
E agora a surpresa da menina que é flor,
Que é linda e também é mulher.
Ao escolher sua vida, sabendo o que quer,
Eleva a voz de sua sublime alma
E, alcançando o íntimo de seu primeiro irmão,
Pede-lhe com calor, mas suave e calma:
Compareça à minha festa com o seu coração,
Mas não se esqueça da rosa amarela,
Pois eu quero que você enfeite com ela
O meu destino, o meu amor, a minha união.
Ao relembrar o início de seu namoro, que ocorreu em Campos do Jordão, com o jovem que se tornou seu marido e pai de nosso neto, fiz este poema…
A FLOR E O AMOR
O frio, o som do vento que açoita e, do Jordão, os Campos
Verdes árvores, arbustos e, à noite, sempre os pirilampos,
Altiplano e floresta jamais conheceram entre suas tantas flores,
Aquela Flor de meiguice, pura beleza, senhora das cores.
Menina inocente, quase criança, desabrochando encanta,
A todos que a vêem, amigos e amigas, seu rosto levanta,
Sorriso faceiro, olhar luminoso, de fada é o andar,
Atrai corações, desperta atenções, é fácil de amar.
E os pares divertem-se: são cantos, são bailes e belos passeios,
Folguedos, brinquedos, gracejos, e os “flirts” são meios,
Do experto Cupido suas vítimas flechar, sem dó nem piedade,
Não importa o tamanho, a esperteza e, nem mesmo, a idade.
Então o encontro: sem luxo, sem pompa e até sem alarde,
Esperança de todos, razão da vida, elo com Deus, fogo que arde,
De um peito ao outro, a chama que é lume, paixão e ardor,
Transpassa os corações, tornando em um só a Flor e o Amor.
Passados os anos, algum tempo após o casamento de ambos, a beleza de seu amor e do amor de nosso filho e sua namorada, hoje nossa nora, voltou a inspirar-me. Então, surgiu…
UM SÓ
De cada jardim uma flor:
O cravo de aromática essência,
A rosa de intenso perfume,
Belas e tenras, sem muita paciência,
Em seu íntimo a força de um lume
Faz que se atraiam, de repente,
Inda que de uma seja o outro diferente.
Seduzem-se e se aproximam, paixão…
Podem admirar-se: flores tem coração!
Superando espaço, obstáculos, tropeços,
Em novo canteiro união e começos,
Da luta contínua dissabores e alegrias,
Só juntos vencendo em todas as vias.
Distintos na origem, um ao outro cedendo,
A tudo superam se amando e crescendo
E de dentro do cravo semente contida
Fecunda a rosa, milagre da vida,
Deixando o amor, que só se pode sentir,
Surgir como ser para se ver e ouvir,
Mostrando, então, ao casal singular:
Vocês são um só, construíram seu lar!
Algo que sempre impressionou o meu coração emotivo foi o milagre do nascimento. Um ser gerando um novo ser e o caminho para se vir à luz. Assim surgiu…
À LUZ
Da passagem de um túnel
Úmido, estreito e quente,
À sensação solitária de mãos,
Que sacodem e apalpam
E um inexplicável clarão
Que impressiona a retina.
Ainda sem se saber
Se se é menino ou menina,
Estala uma palmada:
Susto, choro… bocas que falam
– E a percepção repentina
De que já se é gente.
O colo gostoso,
O calor de um peito… aconchego,
Soninho dengoso, lembrança do escuro…
Chamego!
Lá flutuava, até nadava,
Dormia e sorria.
A pressão do carinho,
O calor do afeto,
E, de repente,
Sem se entender o que se sentia,
Já não se é feto,
Nascemos,
E à luz viemos…
E ai, num belo dia de Primavera, nossa filha nos deu um neto. Trata-se de uma sensação que só os avós sabem como é. E foi essa sensação que gerou a poesia…
SOMA
A existência é uma soma.
Dias, meses, anos, décadas…
Como se, pela janela de um trem,
As imagens, as boas e as ruins,
Desfilassem, alternando-se, mas passando.
Embora adição permanente,
Contradição,
É subtração decadente.
Existe a dor que é benção,
E, por isso, não vai… Acompanha,
Existe o amor que é bálsamo,
Porque é verdade tamanha.
É a soma dos bons,
De onde se tiram os maus,
É o acúmulo de dons,
Que ensina a mexer os paus.
É o crescimento da fé,
Mesmo que seja invisível,
Aprendendo com gente que é,
Ainda que seja insensível.
É o um mais um são dois.
Sem pesar o que vem depois,
Pois, amar os transforma em três,
E se vai começar outra vez,
Um dia atrás do outro,
De gametas constante junção,
Adere o sêmen à corola da flor,
Juntar células, mais células… Calor!
Gerar filhos é soma de amor,
E o resultado da operação?
Ser avô…
O que é pura paixão!
E não há nada mais especial do que brincar com um neto. O meu, além de todas as deliciosas brincadeiras que fazemos, algumas vezes se transforma – de mentirinha, como ele mesmo diz – em “Spider Man” (ele prefere falar o nome do super-herói em inglês em vez de chamá-lo de Homem Aranha), o que me levou a criar um fictício vilão alcunhado “Homem Formiga”.
E ai saímos lutando, ele sempre me vencendo, mas quando eu finjo dominá-lo, ele busca o socorro da avó, por ele transformada em uma super-heroína a qual foi dado o nome de “Mulher Arco-Iris”. Assim apareceu o…
O HOMEM FORMIGA
De repente se está de joelhos
Rolando pelo chão da sala
Atracado a um herói pequenino,
Que mais parece um menino
E que entre socos lhe fala,
Dá ordens e até conselhos:
– Você é um vilão malvado
E eu sou um super-herói
E a minha teia vou jogar
Para mantê-lo bem dominado,
Enquanto você vai ver como dói
Ao “Spider-Man” atacar!
– Qual é o seu nome? A pergunta estala
E, rapidamente, devo responder
Alimentando a gostosa intriga,
Deitado bem no meio da sala,
Com o herói a me submeter:
– Eu sou o temível “Homem-Formiga”!
E faço logo uma garra com a mão
Ameaçando o poderoso herói:
– Eu corto a sua teia, agora vou vencer!
E prosseguimos a rolar pelo chão
E a cada história que ele constrói
Abraça-me com força para me deter…
Tão grande e farta a imaginação,
Que vejo o brilho em suas iris
Ao buscar o socorro da super-heroina.
Segurando com força a minha mão,
Grita alto: – “Mulher Arco-Iris” –
E logo chega a ajuda feminina.
E o faz de conta segue em frente
Todos os três a se engalfinhar,
“Arco-Iris”, “Spider-Man” e o “Formiga”,
Até que o menino, de repente,
Cenho cerrado, torna a mandar:
– Vamos parar com essa briga!
E como é grande a alegria
Ao ouvir do nosso herói a voz,
Fingindo a máscara sacar:
– Podem tirar a fantasia,
Vocês são de novo os meus avós…
E do que mais vamos brincar?
Cadê o “play-station? Vamos jogar…
Essa mesma criaturinha, que está no Maternal, participou de uma brincadeira educativa promovida pela professora como se fora uma busca ao tesouro. Ao final da tal busca, a educadora começou a ensinar às crianças o significado figurativo de tesouro, perguntando a cada uma delas, quem seria o seu tesouro.
Umas apontaram a mãe, outras, um brinquedo, outras, a “Babá”, enquanto meu neto, ao ser indagado, disse com muita segurança: – o meu tesouro é o meu cachorro Barney, que fica no sítio do vovô.
Trata-se de um velho e bonachão Labrador, de cor negra, que permanece em nossa casa no haras e de quem meu neto faz gato e sapato. Quando minha filha me contou isto, descarregando comigo nossas malas, pois estávamos no próprio haras, escrevi…
MEU TESOURO
Perguntou-me a tia Cris,
Igualmente aos meus colegas,
Como se fosse algo a esmo,
– Quem é mesmo o seu tesouro?
E com as mãos sujas de giz,
Entre farras e muitos pegas,
Conversei comigo mesmo,
“Quem é mesmo o meu tesouro?”
Pensei na Mamãe e na Mê,
Na vovó “Ice” e na vovó “Iana”,
Nos vovôs e no papai…
No Play Station e na TV,
Numa coisa bem bacana
E, de repente, a ficha cai…
Na verdade me lembrei
Lá do Sítio do Vovô,
Das galinhas e dos pintinhos,
Com quem eu brinco nos ninhos,
Sempre que lá eu vou
E dos cavalos em que eu andei.
E com uma coisa eu atinei,
Bem debaixo do meu nariz,
Embora negro e não de ouro,
Estava o Barney, agora eu sei
E logo disse à tia Cris:
– Meu cachorro é o meu tesouro!
Falando em Sítio Santa Rita, lugar lindo e abençoado onde mantenho meu haras e onde meus filhos, os amigos de meus filhos, os nossos amigos e os amigos de nossos amigos sempre gostam de estar, lá deixo vir à tona também os meus pendores culinários, descobertos aos catorze anos, quando meu falecido pai, que construía estradas pelo interior de São Paulo, levou-me, de castigo, para a sua pior obra (uma estrada de terra ligando as cidades de Apiaí e Ribeira, no Vale do Ribeira), vez que eu fora reprovado na quarta-série do ginásio (nem sei mais a correspondência no ensino atual) por ter-me dedicado mais à natação do que aos estudos, fazendo-me trabalhar como peão na picareta, pá e enxada, durante todo o verão, abrigado no acampamento da obra e obrigado a seguir a mesma jornada dos trabalhadores, inclusive, assumir o preparo da “bóia” (comida) numa escala de revezamento.
Tal lição levou-me a nunca mais ser reprovado e a entrar na Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP) sem cursinho preparatório para o vestibular. No acampamento dos trabalhadores aprendi a cozinhar e foi despertado o meu interesse pela culinária em geral e, em particular pela “pizza”, na qual me tornei um “expert” sempre aplaudido (não sei se sinceramente) pelos meus comensais.
Entre algumas brincadeiras que gosto de fazer, lá surgiram duas poesias com viés culinário: a primeira é a receita da “pizza” “Margherita”, considerada a rainha das pizzas por ter sido criada, há mais de um século, com as cores da bandeira italiana (verde, branco e vermelho), por um “pizzaiolo” napolitano alcunhado “Nazzo a Cane”, em homenagem a então soberana da Itália chamada “Rainha Margherita”
A RAINHA DAS PIZZAS
(MARGHERITA)
No campo a semente,
É o trigo dourado,
Colhido por gente,
Vai ser esmagado,
Com grande carinho,
Bem lá no moinho.
Dia frio ou dia quente,
Enorme alagado,
Água fria envolvente,
Com gosto salgado,
De lá, com jeitinho,
Se extrai sal marinho.
Tem grande caroço,
De polpa coberto,
Nasceu sem pescoço,
Mas gosto bem certo,
A oliva é origem
Do azeite extravirgem.
Da fonte o fluido,
Claro e transparente,
É água e tem sido
Mais um componente,
A ligar toda a massa,
Como pão que se amassa.
E aqui, ainda falta,
Uma leve pitada,
De cana bem alta,
Folha verde e delgada,
Açúcar docinho,
Mas, só um pouquinho.
Então começamos
A pensar em recheio,
Tomate buscamos
E cortamos ao meio,
Saem pele e semente,
Com gelo e água quente.
E agora só resta
A polpa macia,
È só o que presta
Enchendo a bacia.
É este o conselho
Pro molho vermelho.
Do curral ouço o berro,
É búfala leiteira,
Tiro leite e não erro,
Na ordenhadeira.
Dali para a usina,
De queijo, é oficina.
Azeda e fermenta,
E em massa se torna,
Se esfria e se esquenta,
Água fria e água morna,
Branca e não amarela,
Surge a “mozzarella”.
Do verde da horta,
Vêm lindas folhinhas,
O cheiro é o que importa,
Das lindas plantinhas,
Manjericão o seu nome,
É o sabor que se come.
E agora chegamos
Ao toque final,
O forno bem quente
Dá o tom magistral,
Redonda e bonita…
Ai está a “Margheritta”!
A segunda poesia surgiu quando, ao ler um artigo do (Fernando) Veríssimo, tomei conhecimento de uma quase preferência nacional, à qual me ajusto perfeitamente…
PICO DOURADO
Vejo aquele monte tão perto
E, atônito, não sei se estou certo,
Pois ele me parece coberto
De neve branca e em grãos,
Com pequenos e delicados vãos.
E pelas encostas do vulcão singular,
Consistentes as neves se tornam,
E, como placa contínua, adornam
Um pico dourado a brilhar…
Mas, num instante e de repente,
Atraído pela imagem espetacular
Ao perceber que ali tudo está quente,
E me fascina aquele topo anelar
De intenso amarelo candente,
Cuja fina película envolvente,
Com a ponta do aço me ponho a furar,
Libertando suas lavas viscosas,
Que em douradas ondas copiosas,
Qual líquido açafrão, tingem as neves,
Aguçando o meu paladar
Amarelando os grãos que passo a comer,
Com muito gosto e grande prazer,
Emergindo claro de linhas tão breves,
Que o tal monte, para mim tão bonito
É um delicioso prato de arroz com ôvo frito!
Parte 5 – A vida na imaginação
“Tenho o caminho do que sempre quis e um saveiro pronto pra partir”
(Milton Nascimento)
Em algumas ocasiões, embora feitas quase de brincadeira, certas poesias vão emergindo. Uma delas fiz enquanto esperava minha mulher fazer compras em uma loja de “shopping center”, sentado em um café, situado no corredor em frente, e sendo obrigado, já que não sou cego, a ver brasileiras a caminhar.
Como sempre, servi-me de um guardanapo e surgiu…
BRASILEIRA
Como descrever a beleza,
Que, na brasileira, é certeza
Não importa onde more
Se só ri ou, também, chore…
Como descrever o andar,
Pernas e quadris a balançar
O jeito felino de se mover
A gata que todas parecem ser…
Qual a diferença que há
Nesse vai pra lá, vem pra cá,
Das outras mulheres do Mundo
Que, por ele, nascem a cada segundo…
Essa graciosidade quase sem fim
A fascinar gregos e americanos,
Cariocas, paulistas, baianos
Só descreveram, mesmo, Vinicius e Jobim.
Na mesma ocasião, com a demora de minha mulher na compra, em outro guardanapo, ainda fiz…
O DEPOIS
E se viver for morrer,
Já tenho idade pra indagar,
Pois muita vida vivi
Pra não saber se é aqui,
Que tudo vai se passar,
Se sentir… acontecer…
E se viver for morrer,
Com tanto que, hoje, eu sei
Pelas coisas que já lutei,
Fiz mais do que sempre quis
E mesmo assim fui feliz
Já sei daqui o que é ser…
Se viver for morrer,
Quero te ter outra vez,
Dos filhos, quero os três,
Também os netos eu quero
E ver a Deus eu espero,
Pois lá serei o mesmo ser.
Do mesmo modo, em outra oportunidade, fui deixado, sentado debaixo de um guarda-sol, a observar a praia e o mar, no Guarujá, impedido que estava de caminhar por um problema de coluna, ora sanado cirurgicamente, enquanto minha mulher foi caminhar ao longo da orla com um casal de amigos.
Como quem tem olhos os tem para ver, pedi papel e caneta ao sujeito que vendia água de coco, o qual me cedeu duas folhas de uma surrada caderneta de anotações, permitindo-me descrever, em dois sonetos, as belezas que acariciavam minha vista. O primeiro — já transformado em canção em parceria com o Nilson Ribeiro– foi…
MAR ILUMINADO
O sol quente a iluminar o mar
É lembrar, ainda que sem querer
Que presente é poder viver
Vendo o sol a inundar o mar…
Espumas brancas que brilham
Por furtarem os raios do sol
Ondas de verdes cores que oscilam
Indo e vindo a embelezar o arrebol…
E eu aqui estendido na areia
A pensar que se agora isto é lindo
É certo que em noite de Lua cheia
Águas negras e suas vagas a lampejar
Fazem que o feliz mortal siga sentindo
Que Deus mantém no mar diamantes a flutuar…
E o segundo poema, também escrito à vista do mar, é quase mitológico…
SEREIAS
Quem disse que não existem sereias
Não conhece do Brasil as areias,
Nunca esteve na beira do mar
Onde as deusas se põem a caminhar…
Incrível, mas importa dizer,
Do oceano elas nunca vieram
E Netuno se contenta de as ver,
Pois seus súditos jamais as tiveram.
São brancas, mulatas, são belas,
Sob os beijos do sol ficam lindas
Puro bronze com ouro e canela
Perfumadas, gostosas, são aquelas
Que na praia em idas e vindas
Transformam uma só cor em aquarela…
E, como eu disse na ode NÃO SEI SE SOU, “a arte é viva e à frente está, em qualquer ponto, aqui ou lá”. Ao artista, ainda que modesto e pouco confiante, cabe aprisioná-la com os instrumentos de sua sensibilidade e criatividade, sejam eles o pincel, o cinzel, a pauta musical ou as letras.
Não sendo pintor, escultor ou músico, restou-me a poesia para descrever o que vejo, o que sinto, o que me fascina e o que me emociona, seja o amor ou seja a dor. E assim foram surgindo…
A FOLHA QUE CAI
Uma folha caiu,
Mais uma, outra mais…
Incansãvel é o tempo, impiedoso é o vento.
Uma folha que cai,
O outono começa
E outra folha se vai,
Flutuando sem pressa…
Ela caiu, é uma folha
E não tinha escolha,
É a força do outono
E deitou-se no chão, outras folhas vieram,
Cumpre o tempo sua obra,
Avança sempre sem volta
E chegou o inverno…
SONHEI
O que se quer
É o que se busca,
Mas não se alcança…
E eu sonhei!
Parecia real,
Não sei se era crença.
Tudo se passa num instante,
Sonhos sonhados em sonho…
E eu sonhei!
Era só um sonho…
FLORES
Enfeitam amores e até as dores
A gala, o luto, o nascente e o poente.
São coloridas, são vidas, são flores,
São belas, são rosas, violetas e malmequeres,
São primaveras, acácias… São mulheres.
E também são homens,
Crisântemos, lírios, antúrios…
São alegres… São tristes,
São luzes, são matizes,
Amarelas, vermelhas, brancas, azuis…
Estão sempre-vivas, mesmo feridas,
São quase gente, mas são só flores…
O CAMINHO DO SOL
Aos poucos, uma tênue claridade,
Quase imperceptível, mas… Verdade,
Segue, avança, rasgando o horizonte.
Parece fluir por um amplo canal,
Aparente fusão, cada qual de sua fonte,
Até ser parida, como luz matinal.
Antes fraco, ora brilho, é matiz
Espargindo cores e, pintando o céu,
Misterioso sob transparente véu,
Mantém-nos em dúvida desde a matriz,
Que nome terá? Para alguns, é Aurora,
Para outros, Nascente… e é luz agora…
Não importa o sexo, é beleza,
Que, nem sempre, afasta a tristeza.
Luminosidade e calor crescentes,
Espalha-se por espaços e mentes,
Intenso colorido, agressivo e forte,
De leste a oeste, de sul a norte.
E sobe, vertendo noite em dia,
Inundando a lida, o labor, a manhã,
Nuvens, trovões, tormentas a facear.
Esfera dourada, por frestas espia,
Mais força e calor… puro afã…
Começa a tarde, já mais devagar.
A tudo ultrapassa, são brumas, são raios,
Bonança, ciclone, cruel tempestade,
Refletem, agora, suas luzes mais brandas,
Brilhos e cores em tênues desmaios.
Com barreiras aprendeu, cresceu em idade,
E saber ajuntou por todas as bandas.
Então o declínio lhe traz outro senso,
Esmaecem suas cores, seu brilho arrefece,
Mais belas são elas, encentram a luz,
Converge-se aquele, mais calmo e mais denso
E tingem as sombras, os males… A prece,
Suaves nuances dos tons de uma cruz.
Nascer impulsivo não foi por acaso,
Com força passar pelo dia é preciso,
Sem ela, impossível fazer a história,
Efêmera a vida, já chega o ocaso,
Mais belo é o poente, mais sério e conciso…
E na noite mergulha em busca da glória.
VIVER
Sabes o que é viver, meu menino?
Se alguém me houvesse perguntado,
Na abstração da mais tenra idade
Em que o mundo de azul é pintado
E onde tudo é brinquedo e ansiedade.
Responder eu jamais poderia,
Já que tão distante do fim estaria,
Com a inocência e a força do novo
Sem ter provado do viver o açoite
E nem saber que esta Terra é um dia
Com manhã, com tarde e com noite,
Mas que, aqui, não começa de novo….
Sabes o que é viver, meu jovem?
A cabeça… só sonhos e planos
Na luta por eles crescendo
Amando muito e as camas vencendo
Sem aprender com alheios desenganos.
Responder eu não poderia
Pois, certamente, eu ainda riria
Das noitadas regadas a vinho
Dos sabores da farta comida,
Dos amores trazidos ao ninho,
Sem saber quão curta é a vida
E que, aqui, não começa de novo…
Sabes o que é viver, meu homem?
Tanta tormenta já tendo vencido
Sabendo muito, mas sem saber nada
Inda arrogante qual o dono da espada
O bolso mais forte e o corpo doído.
Mesmo assim me fugiria a resposta
Vez que ter tanto é magia composta
De muita grana e apego ao poder
Que a vida toda se luta por ter
Sem se saber que ele trás como sina
A corrupção – enquanto encanta e fascina,
Mas que não dá a vida de novo…
Sabes o que é viver, meu velho?
Sim, agora posso eu responder,
Tantas coisas tendo enfrentado,
Com tudo o que pude aprender
E menos futuro do que passado.
Sei que o amor é o contrário da dor,
Embora a dor possa vir do amor,
Sei que tudo envelhece na gente
A não ser o que temos na mente,
Pois bem dentro das nossas lembranças
Somos adultos, somos jovens ou crianças,
Mas nada, aqui, tem início de novo…
Afinal, aprendestes, então, o que é viver?
Viver é ter, sem saber que se tem
É querer, pretender e alcançar
É perder, é sofrer e é deixar
Seja coisa, ou gente ou bem,
É continuar a amar com amor
Sem que o físico sustente o vigor
É murchar, encolher, definhar
Ver a luz a sumir do olhar
Perceber os ouvidos mais moucos
Com a criança ainda se emocionar,
Mas sentir que viver… é morrer aos poucos.
AMIGO VELHO
Primeiro amigo,
Os desajeitados começos,
Trôpegos passos,
Já existe a mão forte
Que ampara tropeços.
Amigo,
Ainda que jovem,
Parece tão grande…
E tão velho,
Quem é esse homem?.
Melhor amigo,
Ele nos guia
E vamos crescendo.
A mesma mão forte,
Ora envelhecendo.
Amigo velho,
No que é preciso
Com ele contamos
A vida passando,
Já temos juízo.
Amigo ou velho?
Já não dependemos,
Temos um rumo, e pensamos:
Mais que ele sabemos
E parece tão… velho.
E por falar em amizade, alguns anos atrás, a dor da perda de um grande amigo de infância, daqueles que a própria vida se encarrega de separar, mas que estão sempre presentes em nossas mentes e em nossas preces, levou-me a construir, logo depois de seu velório, uma das poesias mais emotivas da minha vida…
AMIGO
A gente não sabe por que, mas sente…
Num encontro, numa briga, no jogo,
Seja no início, no meio ou no fim,
Mas, de repente, uma coisa meio assim
Entra no peito, se aloja e logo, logo
A gente não sabe por que, mas sente…
Não é escolha ou obrigação, é presente
Que não se sabe de quem, nem de onde,
Chega concreto, completo e já pronto
E faz brotar lá de dentro, ponto a ponto,
A sensação que no peito se esconde
E a gente não sabe por que, mas pressente…
Mescla de afeto, simpatia, sentimento
Que traz paixão, discussão, recomeço,
Não se vê dom, beleza ou qualidade,
É confiança, desprendimento… é amizade!
É aquela mão que socorre o tropeço,
É a ausência presente em cada momento.
Amigo é o amor que prescinde de sexo,
Não precisa estar perto ou junto, nem nada,
A impressão de calor é tão forte e constante
Inda que a vida – que passa num instante –
Separe caminhos ao longo da estrada,
Amigo é o amor sem motivo e sem nexo…
E ai, um dia, sem aviso, num repente,
Chega a notícia que não se esperou,
Com ela a dor, sofrimento… realidade,
Que fere o peito como ferro – saudade!
Ele se foi para sempre, nada restou
E a gente sabe porque… e como sente!
Na mesma ocasião, via Internet, recebi lindas imagens fotográficas da terra, produzidas por lentes instaladas em satélites e que revelavam o lindo planeta em que vivemos, com suas cores belíssimas onde prevalece o azul.
Pelas fotografias era possível perceberem-se as nuvens de areia do Saara invadindo o Atlântico, as montanhas cobertas de neve, os rios serpenteando pelos continentes e, até mesmo, com muita clareza, o dia e a noite unidos por um traço. Mas não se vêem seres, humanos ou não. Não se percebem dores, guerras e sofrimentos e isto me levou a tecer…
QUANDO SE OLHA DO CÉU
Quando se olha do céu,
É quase todo azul e tudo é tão perto,
Água que invade a terra, areia que cruza o mar,
Nuvens sobre montanhas, luzes a brilhar,
Gente não se vê, parece tudo deserto.
Os gritos não se escutam, nem se sente a dor,
Dos que sofrem por não conhecer
O que é ser um humano ser,
Num mundo lindo de tão linda cor.
Quando se olha do céu,
Claro e escuro se beijam e, num abraço,
Dão voltas e mais voltas unidos,
Sem qualquer receio de serem punidos,
Posto serem partes do mesmo traço.
Não se pode entender por que lá existem
Tiranos tão cheios de ódio e arrogância
Abusando do mal com toda a sua ânsia,
Explodindo rancor sobre os que resistem.
Quando se olha do céu,
O branco da neve copulando a terra,
Gerando riachos que se tornam rios
E que despencam nos veios, enchendo vazios,
E se lançam nos mares já longe da serra.
Enquanto pessoas se ferem e maltratam,
Seus gritos ecoando por todas as ruas,
Sem que suas vozes, por serem tão nuas,
Atinjam o alto, já que o céu não alcançam.
Quando se olha do céu,
A cor tão bonita que tinge a esfera,
Mostrando nuances do “pink” ao lilás,
Conduz o calor que do espaço traz,
Pintando o mundo… e não é quimera.
Porém a distancia torna os seres inermes,
Não se vê movimento nem vida jamais
Não se notam humanos nem os animais.
Haverá mesmo homens ou serão todos vermes?
Parte 6 – O homem e suas circunstâncias
“Dentre as ervas mais daninhas
Nascem pequenininhas
Lindas e buscadas flores”
(Joffre Sandin)
E então nos lembramos do quanto o homem é egoísta e perverso. De como se pensa e age em benefício só próprio. E como nos olvidamos dos mais carentes e como nos desviamos dos problemas existentes e enfrentados pelos esquecidos da sorte.
Mas é preciso que nos mexamos, que busquemos soluções para melhorar a vida das pessoas, pois elas, afinal, são mais importantes que quaisquer outros seres animais ou vegetais.
ANDRAJOS
Nas vias os vemos,
Nossos medos nos calam,
Os farrapos tememos,
Por que ali chegaram?
Não é difícil saber
Se quisermos pensar,
Basta em seus olhos ler
O que os fez despencar.
Tropeçando no encanto,
Descrendo das fontes,
Salgando no pranto
Tristezas aos montes.
De vivos foram órfãos
Debaixo de um teto,
Faltaram-lhes as mãos
Devedoras de afeto.
Na mais tenra idade,
Forçados no sexo,
A pressão da maldade
Ceifou-lhes o nexo.
Entregaram-se à rua
Tentando escapar
Da verdade mais crua,
Do tormento do lar.
Do álcool os vapores
Lhes cozeram as mentes,
Mitigaram-lhes dores
Queimando sementes.
Ao entorpecerem ilusões,
Os escravos dos pós
Põem fora as razões,
Cada dia mais sós.
Faltou-lhes escola,
De outro era encargo,
Ao dar-lhes esmola,
Nos pomos ao largo.
Mendigos, leprosos…
Eles sempre existiram.
E os homens vaidosos
Por que permitiram?
Aos políticos os votos,
Nós nos justificamos,
Pois, do ouro devotos,
Neles nos ocultamos.
Mas, quem são os farrapos,
Que nas ruas os achamos?
Tais andrajos e trapos
São só seres humanos.
FAVELA
Gente pendurada em pencas
Tentando escapar de encrencas
Em casas de taboa e zinco
Onde viver… só com afinco,
Os trapos pendendo de fios
A superar os pratos vazios
Suportando o frio e o calor
Ultrapassando o mal e a dor
Em tão estreitos espaços,
Tortos e mal feitos degraus,
E por eles todos os passos
Sejam dos bons ou dos maus,
Que se cruzam a pés descalços
Em sandálias ou chinelos falsos…
Desgastados nas pedras do chão
E os ouvidos a ouvir sempre não…
Sob os pés, sujeira, lama e lodo
Enxurrada de lixo a manchar o todo
Donde brotam criminosos espinhos
Que sempre trazem pesar e maldade
Prá acabar, na mais tenra idade,
A morrer nos mais sujos caminhos…
Mas são o medo, o sofrer e as dores
Que alimentam, todavia, a esperança
No coração de cada criança,
De que ainda encontrem as cores
A colorir o amor do que ama,
Fazendo vir bem de dentro da lama
Os batuques que invadem a alma
E permitem aos dons que, na calma,
Criem músicas e vivam amores
Pois ali o que mais nasce são flores…
E a exploração criminosa da prostituição infantil, as mentes pedófilas que proliferam impunemente pelo mundo e que, infelizmente, entre nós, geram estatísticas dilatadas e cruéis? Como lutar contra isso? Só com educação e solidariedade. Só com a preocupação com o próximo. Só fazendo além da nossa parte. Mas, ao poeta não pode escapar o que ocorre à sua volta. De tudo deve falar, pois é o seu meio para alertar…
PARA FALAR DE PÉTALAS
Só se vê lama e barro ao redor
Escuridão da sorte,
Desvios e a própria morte,
Que pode entanto ser mais dura
Quando a alma, ainda pura,
Vive presa em corpo menor…
E no sujo e fétido lodo
Dentre as ervas mais daninhas
Nascem pequenininhas
Lindas e buscadas flores
Presas frágeis para maus amores
Todo dia e o dia todo…
Com certeza, ao crescerem
O frescor de seu perfume
Atrairá, é de costume,
Dos arredores de seu canteiro
Os que exalam o mau cheiro
Da prata ganha sem merecerem…
Exploradores sem preconceito
Homens, mulheres, até parentes,
Buscam as flores, que tão carentes,
Se submetem a tais bandidos,
Cedem suas pétalas entre gemidos
Sendo vendidas sem ter direito…
Tão dura a vida, mundo atroz
Em cada rua deixam seu sangue
Na cama, na praia, mesmo no mangue
Seu corpo, banquete servido inteiro
Para que o mau ganhe dinheiro,
Cada uma delas com seu algoz…
E todos vêem o quão perverso
É o dia das flores de tristes sinas
Vítimas vivas, e mãos assassinas
Lhes arrancam pétalas à nossa vista
E nos omitimos sem deixar pista,
Mas mesmo assim inspiram verso…
Na realidade, a maioria das poesias que faço começam me despertando do sono, acordando-me de madrugada e obrigando-me a registrá-las. Assim, recentemente, esta “amanheceu”…
MÃOS
Intensos e poderosos instrumentos
São as mãos em todos os momentos,
Desde o afagar do seio que alimenta
Ou empolgar o livro que acrescenta,
A participarem de rodas e folguedos,
Dos jogos e de todos os brinquedos…
Apêndices de tal forma úteis,
Mesmo nas horas mais fúteis,
São capazes de tantas proezas
Nas alegrias e, também, tristezas.
Abraçam e excitam o namoro
E enxugam as lágrimas do choro…
Incríveis ferramentas da arte
São do corpo imprescindível parte
Ao maestro que rege a orquestra
Empunhando a batuta mestra
A liderar músicos em tantas vias
Encantando mentes com melodias…
Concedem ao artista produzir beleza
Com o que vê e sente na natureza
Esculpindo a pedra com seu cinzel
Pintando as telas com seu pincel
Colhendo do mundo o que extasia,
Lápis e papel: a própria vida é a poesia…
Por qualquer caminho ou atalho
Encontram sua razão no trabalho
Produzem coisas e alimento,
Do povo sério sendo o alento,
Mitigam sofrimento e dores
Nas habilidades de alguns doutores…
Às vezes, entanto, têm mal uso
Servem elas à força e ao abuso
Destratam, ofendem e maltratam
Excedem do poder e, até, matam
São mãos de donos com tristes sinas
Que as podem fazer assassinas…
Outras, por sua vez, mercenárias
Pertencem a modernos párias
Ora travestidos de políticos
E que desdenham de seus críticos
Em discursos e remorsos vãos
Palavras sujas pelas próprias mãos…
Por certo, o mal é a exceção
E o que vale mesmo é a emoção
Quando se entrelaçam ardentes,
Companheiras que são do amor
Ou quando amparam os carentes,
Delicadas ao tocarem a flor
Nascem pequenas, fofas e calmas
E crescem logo, e batem palmas
Em festas, progresso e na vitória
Para cada ser há uma história
De quase tudo são as autoras
Em qualquer enredo as lutadoras…
Mas envelhecem, a vida passa…
E não lhes falta uma nova graça
Embora trêmulas e enrugadas,
Ensinam coisas, mostram estradas
Afagam cabelos de novos entes,
Que a sorte lhes deu como presentes…
Pouco tempo depois, após uma severa cirurgia de coluna a que me submeti – felizmente pelas mãos de um ético e competente jovem médico – ainda no interior do Hospital Albert Einstein, no dia seguinte à intervenção, produzi outra poesia sobre mãos, desta feita homenageando tanto o cirurgião que me houvera operado, como também outros dois com as mesmas qualidades de caráter e competência que conheço, à qual chamei de…
MÃOS QUE SALVAM
Já falei de mãos
E do que elas fazem
De bem e de mal…
Mas algumas em especial
Tal valor elas trazem
Que tornam a outros sãos.
Incrível como acontece,
Pois produzem muitas lesões,
Fazem cortes, contusões,
Instrumentos tantos a esgrimir
Abrindo vãos para prosseguir
E curar… Quem sabe em prece.
A inspiração lhes dá os motes,
Para fazerem a sua parte
Com atenção e muita arte,
A dominar a emoção,
Que insiste em nublar a razão,
Às vezes poetas, outras sacerdotes.
E mexem fundo no coração
Com a hábil sensibilidade,
Que Deus lhes deu, é verdade,
Vinculando-os, por certo, à ética
Para usarem, com liberdade poética,
As suas mãos de cirurgião…
Às vezes, quando nos encontramos com amigos em festas, como nas de casamento, por exemplo, algumas amigas me pedem para fazer alguma coisa a respeito da ocasião. No evento matrimonial dos filhos de dois casais de amigos ocorrido recentemente, uma das senhoras presentes em nossa mesa e que é italiana, mas aprecia as poesias que crio, fez-me tal pedido e, novamente, usando um guardanapo de papel…
AMIGOS
De repente nos encontramos
E, sem saber porque, felizes ficamos
Vez que nos reconhecemos…
Quiçá, outra vida tivemos
E lá, talvez, nos tenhamos visto
Por certo, isso foi bem quisto…
O que importa é que ora nos revemos
E que somos amigos, percebemos
E, pela vida, assim seguiremos…
Com a mesma amiga italiana e seu marido, também, italiano, por vezes tento exprimir-me no idioma peninsular, não obstante jamais o tenha estudado. Mas, como conheço, com alguma profundidade a nossa própria língua, por serem ambas neolatinas, como também o são o espanhol e o francês, tenho uma certa facilidade em me expressar, o que os impressiona.
Por força disso, esta minha amiga, revelando gostar muito de minhas poesias (muitas das que escrevi ela coleciona) perguntou-me se eu seria capaz de fazer uma em italiano. Eu lhe disse que tentaria e assim o fiz, optando por um soneto, vez que originário da Sicilia, mas imortalizado na magnífica obra de Dante Aligheri, de onde migrou para, praticamente, todos os idiomas ocidentais, inclusive o Português. Dessa maneira, em sua homenagem e ousadamente, criei…
ORIUNDO
Perché un idioma mi piace tanto,
Dove sta l’origine nel mio cuore
Che me fa volare nei sue colore
Ed appassionarme per suo incanto?
Lingua che ha prodotto il sonneto
Nato sotto l’Etna, en mezzo al fumo
Mentre fiori insulari con suo profumo
Impregnavano d’il poeta il petto…
Forma di poesia tanto singulare
Ho inspirato a Dante immanente tema
E con suo pensiero l’universo ricreare
Ed io, qui, in questa vitta ormai
Povero oriundo tento fare poema
Prendendo dei amici amore assai…
A minha aventura pelo Italiano me animou, ao receber pela Internet um video muito bonito de um tango extremamente bem dançado por um belo casal, a fazer em Espanhol uma homenagem a esse ritmo tão sensual…
TANGO
A cada un, una historia
Que se busca en la memoria
Y se pone a deslizar
Romantica pareja a danzar..
Con sus cuerpos en justos lazos
Arrastrandose en ardientes pasos
Recurriendo todo el salon
Y a latir fuerte cada corazon…
Lindo acto de amor bailante
Se mezclan a cada instante
Brazos conduciendo la mujer,
Piernas a se tocar por querer…
Y se van entre abrazos se amando
A cambiar sus passos danzando
Así , rozandose en toques sensuales
En sus mentes solo el plazer, sin males…
Hombre , mujer y su desear
Que se puede ver en cada mirar
Mientras que a todos encantan
Y con sus movimientos se avanzan…
Musica lhena toda de amor
Mismo que se venga del dolor
Esto es el tango desnudado
Y por eso siempre tan amado…
Por outro lado, o meu gosto pela música brasileira, notadamente pelo samba, pela bossa nova, e a incrível admiração que sempre nutri pelos poetas de origem humilde, que constroem suas músicas — verdadeiras obras de arte — nas rodas de samba, nas mesas dos bares, especialmente nos morros cariocas, levou-me a construir…
NO MORRO
Queria ter no morro nascido
E bem no alto ter vivido
E ali, também, experimentado
A visão que tem o Cristo prateado
Das montanhas esculpidas no ar
E recortadas pela invasão do mar…
Queria ter no morro nascido
E com os poetas convivido
Sentindo-me outro bamba
Misturado nas rodas de samba
Vendo as mulatas a requebrar
Com as músicas criadas no bar…
Queria ter nascido no morro
Sem precisar pedir socorro
Para de lá nunca sair
E meu peito continuar a sentir
O prazer que se tem ao cantar
O verde dos montes e o azul do mar…
As relações de amizade que decorrem do convívio das pessoas em ocasiões alegres e saudáveis, como, por exemplo, a praia ou a beira da piscina, sob o sol escaldante, podem acabar proporcionando a criação de poemas, espontaneamente ou a pedido de algum amigo ou amiga, como aconteceu no último…
VERÃO ABENÇOADO
– Como o sol está quente!
E vai queimando a gente
Já de manhã, bem cedinho
Enquanto se busca o carinho
De algum amigo querido,
Que queira manter dividido
Um pedaço na beira da piscina
Olhando a água, que molha e fascina…
– E como o sol está quente!
O rosado do corpo não mente
Imperioso é se reconhecer
Que o calor tem encanto e poder
De moldar e soldar amizade
Entre pessoas de qualquer idade
A se descobrirem nessa mesma hora
No bate-papo e jogando conversa fora…
– E ele ainda está muito quente!
Então se percebe, num repente
Porque, como Rá, já foi deus
Confundiu-se com Júpiter e Zeus,
E foi venerado por Incas e Maias…
Mas no Brasil faz milagre diferente
E deixa todo o povo contente
Ao iluminar as mulheres nas praias…
– Que bom é sentir o sol quente!
Assim se conhece mais gente,
Gente que entra no coração
Tornando mais linda a estação.
Aos poucos, sem querer, os achamos
E alegres nos olhos miramos
Os amigos que temos buscado
E encontramos no verão abençoado.
Mudando de um pólo a outro, e voltando a falar em sedução, pode ela ser originada até por coisas materiais, por entidades, instituições, como, por exemplo, religiões, crenças ou até mesmo, num pais como o nosso, equipes futebolísticas. Dentre estas existe uma que, seja a favor ou contra, a todos seduz: quem não torce por ela, torce contra ela, mas sempre com a mesma força e o mesmo ardor.
É sempre o adversário a ser batido e principal contendor de todos os outros times. Tal sedução coletiva e global fez-me criar a…
TRANCENDENTAL PAIXÃO
Não há o que justifique e nem é um problema,
Impressão que é única de qual lado se esteja,
Quando todos se envolvem num mesmo dilema,
Seja ódio ou amor a sensação que sobeja.
Sem saber bem porque, há aqueles que amam,
E sabendo porque, também há os que odeiam…
Quem detesta tem horror de saber da vitória,
E quem ama só pensa em construir a história.
Por que odiar e por que amar tanto?
Essa mescla de raiva e afeto, é sublime.
Luta empolgante que a ninguém exime,
Do sofrer, do querer, do viver e do pranto.
Pouco importa o tempo, o lugar, o momento,
Em metades iguais parte-se o sentimento,
Para uns é fascínio, é calor, é encanto,
Para os outros é inveja, é dor, desencanto.
Não se pode explicar como o foco de tudo,
Seja um time, uma equipe, um conjunto de gente,
Com camisa, uniforme; tudo muito atraente,
E a glória da garra em defesa do escudo.
Há, também, lindo hino que a todos embala,
E outras músicas que brotam da fé da torcida,
Bando louco que chora e que ri pela vida
E nem diante da perda se dobra ou se cala.
Paira acima de tudo, não há bem e nem mal,
É uma fábula, é uma lenda alcunhada Timão.
Não se sabe o que, nem porque da razão
Da existência de senso tão transcendental.
Loucura a encher até mentes mais sãs,
É louvor, oração, reza brava e umbanda,
De uma parte, de outra, desta ou daquela banda,
Prá que perca ou vença, preces certas ou vãs.
Todo peito que, dentro, traga um coração,
A bater muito forte, no sentido que for,
Sangue quente fervendo de ódio ou amor,
Tem por ti, meu Corinthians, a mesma paixão!
Não importa para que equipe se torça, nem mesmo se se ganha ou se perde, o que vale é lutar — e não brigar — por suas cores, divertir-se com o futebol, prazer disponível para todo o nosso povo, democrática paixão que alguns deturparam e que a nós todos cabe resgatar. Não se deve dividir. O que se deve, sempre, é somar.
Por isso é que finalizo com um cartão de Natal que a todos os amigos envio a cada ano, esperando que, também no em que este livro esteja sendo lido, o que nele digo, realmente, aconteça…
SOMAMOS
Mais um ano… Juntos o navegamos,
Por águas turvas ou claras,
Mas prosseguimos.
Algumas flores, tantos espinhos,
Caminho duro o que encontramos,
Mas das pessoas não desistimos
E agora os afagamos,
Rogando bênçãos à Luz Divina
E que, em outro ano, nossos destinos
Sigam juntos – é o que queremos,
Mostrando a Deus que merecemos,
Porque gente unimos,
Porque amigos somamos!